17.3.10

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A preocupante saúde
dos nossos políticos


Ilustração: Uelinton Silva.


Por Amílcar Neves*

Político brasileiro, em época de campanha eleitoral, é que nem a bernúncia: come tudo que lhe dão. Chega a fazer 13 refeições por dia. Toma cafés desde os mais fortes e encorpados, como os expressos, até aquelas temíveis águas ferventes com tintura da rubiácea, ótimas para uma bela dor de barriga que obriga a incursões emergenciais à privada mais próxima.

Político em campanha se abarrota tanto de gorduras trans, de carboidratos, de colesteróis, de lipídios, de triglicerídeos, de aminoácidos, de amidos, de sais, de suspeitas higienes, de alcoóis nas mais diversas formulações, origens e apresentações, que é lícito imaginar que ele dispõe de um alçapão em algum ponto do baixo-ventre pelo qual substitui um pseudo-estômago cheio até a boca (a boca do estômago) por outro novinho, limpinho, vazio, conformado para mais uma jornada de caça ao voto.

Superada a árdua refrega, os políticos se recolhem a seus gabinetes e conchavos porque afinal não são de ferro. Muitos, talvez todos, passarão a engolir sapos, especialmente os cabos eleitorais e militantes promovidos a assessores parlamentares e ocupantes de cargos de confiança. Engolir sapos também será dieta dos legisladores que se bandeiam para ministérios, secretarias de Estado e diretorias de empresas públicas.

Até aqui, tudo bem: é invejável a saúde dos nossos políticos apesar desse regime absurdo e tão pouco saudável, condenado vigorosamente por médicos e nutricionistas. Qualquer um de nós, mortais eleitores, estaria morto há séculos com um terço, um quinto, a décima parte que seja dessa bárbara rotina alimentar.

A constatação da nossa resistência, entretanto, de nós que vivemos levando porrada a toda hora, vinda de todos os lados, desferida por vezes por alguém de quem não suspeitaríamos jamais e ainda assim levamos a vida com um mínimo de galhardia, cicatrizados porém galhardos, ocorre quando um desses senhores, pego de jeito, com testemunhas, provas e imagens, é formalmente acusado de crime ou, até, vai preso, enjaulado por ter violado todos os limites.

Neste momento, desaba a saúde dos políticos brasileiros e eles passam muito mal, caem em profunda depressão, entram em hipertensão crônica, tornam-se diabéticos renitentes e suas pernas incham perigosamente. Quase têm câncer, aids ou se suicidam. Quase.

*Amilcar Neves, escritor.
Crônica publicada na edição de hoje (17.3) do
jornal Diário Catarinense (Florianópolis-SC).
Reprodução autorizada pelo autor.


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