4.10.12

 "AVENIDA RIO BRANCO" POR
EMANUEL MEDEIROS VIEIRA

*

ORAI POR NÓS!

Detalhe de coleção particular de imagens de 
São Francisco e São João Maria. Foto: Celso Martins

*
O Daqui na Rede foi ameaçado e caluniado através de uma rede social pelo candidato do PC do B à Câmara de Florianópolis, Renato Hercílio Marciano (Renatinho), seu cabo eleitoral Pablo Fernando Dias e o dirigente estadual do partido Lucas Ferreira. Motivo: a divulgação da decisão do TSE confirmando o indeferimento da candidatura de Renatinho. Os detalhes estão no Daqui na Rede.

 Detalhe de coleção particular de imagens de 
São Francisco e São João Maria. Foto: Celso Martins

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Bromélia de casa. Foto: Celso Martins


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AVENIDA RIO BRANCO

Por Emanuel Medeiros Vieira*

AOS SOBREVIVENTES

(E PARA OS QUE NÃO ESTÃO MAIS ONDE NÓS ESTAMOS, MAS ESTARÃO SEMPRE ONDE ESTIVERMOS.)

“Atenção moradores daquela Av. Rio Branco/Se houver sobreviventes/Por favor, apontem o dedo ou telefonem a cobrar;/que quero enxugar deste canto, a teimosia do pranto./Prefiro cantar a vida, aos mortos desenterrar”. (Paulo Leonardo Medeiros Vieira)

“Há sonhos que devem  permanecer nas gavetas, nos cofres trancados até o nosso fim.

E por isso passíveis de serem sonhados a vida inteira”. (Hilda Hilst)

A rua era maior do que o mundo.

E tão pequena.

Paulinho Paiva contempla as estrelas, Chico barriga D’Água entoa melancólicas melodias  – com seus andrajos –, na gaita de boca. Papai vem do mercado, mamãe faz cocadas, Antônio e D., Hamilton jogam  “botão de mesa”: ah, Ademir, ah, Zizinho.

Nunca mais seremos campeões em 50.

As “Filhas de Maria” rezam na Catedral, os meninos na Cruzada Eucarística.

Trocos gibis no Cine Rox – com suas pulgas.

É São João soltamos “‘buscapés” e “diabinhos malucos”.

Sim, a rua – agora só no coração, mítica – era maior que o mundo.

Na hora do “Angelus”, nos reunimos em frente à calçada do número 60 e tomamos groselha, comemos pão feito em casa, sentados em cadeiras improvisadas.

E o noivo da Estela (o Max) morre num desastre aéreo,

E vamos aos jogos no Campo da Liga.

Consola-me, Ilha!

O tempo embutido no homem de bigode,

As duas pontes: o menino e o seu boné, o velho e sua memória.

Redime-me, avenida, riozinho, terrenos baldios, quintais, sabiás, goiabeiras, pintagueiras.

Onde estão todos eles?

E Luiz mata o peru para a ceia de natal, e toma um trago no Catecipes.

E seu Afonso coleciona orquídeas,

E o tempo passa devagar. Passa?

Ou nós é que passamos?

Tanto para lembrar – não existe mais.

A venda do Quidoca, o Miramar, a confeitaria Chiquinho, o hotel Lux, e o soldado toca a corneta no quartel da Polícia.

E o primeiro amor de tranças, loira pálida, saia plissada, meias brancas e longas,  uniforme de normalista?

Sem rima, sem métrica – ma essa emoção atravessando os ossos – algo de mim ficará.

“A memória dos que envelhecem (...) é o elemento básico na construção da tradição familiar. (...)

Só o velho sabe daquele vizinho de sua avó, há muita coisa mineral dos cemitérios, sem lembrança nos outros e sem rastro na terra  –mas que porque ele pode suscitar de repente (como o mágico que abre a caixa de mistérios).”

(Pedro Nava, “Baú dos Ossos).

Não, não é saudosismo – Chico vai servir ao Exército no Rio,

Está no Maracanã em 1950 – naquele silêncio sem adjetivos,

E o primo Paulo Medeiros morre no Rio na casa dos 20 anos.

Ah, brinco com o meu coração – desafio-o,

Onde estás, Avenida Rio Branco?

Não essa de carros, buzinas, condomínios, edifícios, porteiros eletrônicos, seguranças – porque o medo ganhou.

Camuflo duas lágrimas (“homem não chora”)–  porque Clarice e Lucas na foto sorriem para mim  (isso vale uma vida – o resto é o resto.)

Sou de 1945– e encontrei tudo destroçado –  porque a guerra nunca acaba.

Sim: brinco com o meu coração – até onde vai?

(Estou preparado– vem sabiá, canta-me pela última vez.)

Gracinha foi para o convento.

Não estarei mais aqui – ficará o resto do trapiche da Praia de Fora?

E estarei no domingo rezando na Gruta da Trindade, comendo amoras e carambolas, a família reunida.

Vem, Avenida Rio Branco, pacifica-me no XXI século – serei sempre e até depois, o filho da dona Nenem e do Professor Xavier.



 Bromélia de casa. Foto: Celso Martins

*Caro Celso
[...]
Não escrevo por vaidade, mas funda precisão.
Joyce dizia que na velhice, a infância deita-se ao nosso lado.
Falo sobre a infância e a nossa ilha - "outra", mítica, atemporal - que carregaremos sempre no coração.
Essa outra ilha, a especulação imobiliária NÃO DERRUBA, NÃO MATA, NÃO DESTRÓI.
O QUE ELES CHAMAM DE PROGRESSO, É REGRESSO.
Não é saudosismo - como diz o meu sobrinho Paulinho-, mas saudade.
Para mim, o texto tem significado emotivo especial.
Reconheço: não é pequeno...
Feliz e produtiva semana!
[...]
Grato pela acolhida generosa de sempre, Emanuel*
*Poesia numa hora dessas? Em semana eleitoral?
Por que não?
A vã e vil política passa.
Já os poetas - como os cegos - enxergam na escuridão.
Freud dizia: "Os poetas chegaram antes de nós."

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Detalhe de coleção particular de imagens de 
São Francisco e São João Maria. Foto: Celso Martins

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O Daqui na Rede foi ameaçado e caluniado através de uma rede social pelo candidato do PC do B à Câmara de Florianópolis, Renato Hercílio Marciano (Renatinho), seu cabo eleitoral Pablo Fernando Dias e o dirigente estadual do partido Lucas Ferreira. Motivo: a divulgação da decisão do TSE confirmando o indeferimento da candidatura de Renatinho. Os detalhes estão no Daqui na Rede.



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