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E L A
Por Olsen Jr.
Não lembro o dia exato em que comecei a pensar nela. Tampouco, o porquê. Francamente, nenhuma destas dúvidas tem importância. Mas o pensamento ficou, como uma advertência falsamente descompromissada de que “ela” existia, poderia se fazer presente ao seu bel prazer, sem aviso prévio, sem data marcada, sem dia, hora ou local. Semelhante a uma visita indesejável, simplesmente aparecia.
Não costumo dilapidar energia com aquilo que não entendo. Procuro assimilar o fenômeno, aceito o inevitável, mas insubordino-me com o previsível, o que é o princípio do pensamento científico, e pode ensejar outros caminhos.
Agora, é revoltante a maneira como “ela” se apropria, envolve, consome, afasta, isola, tantaliza e despreza todas as pessoas que amamos. Senhora de si, nunca questionada, mais um espectro que ronda a nossa pequenez, por isso parece tão soberana e ao mesmo tempo, tão desprezível.
Aliás, “ela” é a senhora do tempo, uma vez que o tem integralmente, ignorando por esta razão o que nós mortais chamamos de “momentos” (sempre associados à felicidade)... Quer dizer, costumamos conceituar a “felicidade” como uma sucessão de “bons momentos” num determinado tempo, a consciência disso é que faz com que externemos tal convicção. Mas para “ela”, esta (in)distinta senhora a quem me refiro, que é o “seu” oposto, não há convicção que lhe faça frente, a não ser, é claro, a convicção de que não há convicção, tautologia.
Outro dia, tive a sensação de que “ela” estava aqui. Senti em todo o meu corpo o incômodo de sua presença. Algo estranho, a existência de dois olhos invisíveis me observando de algum ponto do universo, digo para mim mesmo que ainda não é chegada a hora e afasto aquele peso sinistro dos meus ombros, com atitudes práticas, metapreferências, se quiserem, facilmente constatáveis.
Feita a escolha, me sinto leve, como o fundista que no sprinter derradeiro, vence seus oponentes, porque (já exausto) não se espera nada mais dele... Talvez, se for um vencedor, que seja alguém diferente, o que pode ser o caso.
Precisamos da crença de que “somos” diferentes, senão a vida seria insuportável.
Apresento agora a “vetusta senhora”. Desprovida dos cinco sentidos, portanto, entre outros, não enxerga, não fala e não ouve: a morte! Que, periodicamente, leva, de uma só vez, várias pessoas de uma mesma família, não fazendo nenhuma distinção particular: se homem ou mulher, se velho ou jovem. Diz-se que é o destino quando acontece com os outros e pouca importância se dá, embora os jovens sofram mais. Mas naquele ano foi a vez de nossas famílias... E éramos jovens.
Uma sucessão de imagens, um volume avassalador de quadros, lembranças, figuras, ações, sonhos, frustrações, conquistas, fracassos, pessoas indo e vindo, tudo se misturando e confundindo enquanto faço o café e aspiro aquele odor familiar, uma vida em segundos, inacabada e perversa, e no rádio, quase imperceptível, a voz do Gilberto Gil cantarolando “... Um dia vivi a ilusão de que ser homem bastaria”...
Não costumo dilapidar energia com aquilo que não entendo. Procuro assimilar o fenômeno, aceito o inevitável, mas insubordino-me com o previsível, o que é o princípio do pensamento científico, e pode ensejar outros caminhos.
Agora, é revoltante a maneira como “ela” se apropria, envolve, consome, afasta, isola, tantaliza e despreza todas as pessoas que amamos. Senhora de si, nunca questionada, mais um espectro que ronda a nossa pequenez, por isso parece tão soberana e ao mesmo tempo, tão desprezível.
Aliás, “ela” é a senhora do tempo, uma vez que o tem integralmente, ignorando por esta razão o que nós mortais chamamos de “momentos” (sempre associados à felicidade)... Quer dizer, costumamos conceituar a “felicidade” como uma sucessão de “bons momentos” num determinado tempo, a consciência disso é que faz com que externemos tal convicção. Mas para “ela”, esta (in)distinta senhora a quem me refiro, que é o “seu” oposto, não há convicção que lhe faça frente, a não ser, é claro, a convicção de que não há convicção, tautologia.
Outro dia, tive a sensação de que “ela” estava aqui. Senti em todo o meu corpo o incômodo de sua presença. Algo estranho, a existência de dois olhos invisíveis me observando de algum ponto do universo, digo para mim mesmo que ainda não é chegada a hora e afasto aquele peso sinistro dos meus ombros, com atitudes práticas, metapreferências, se quiserem, facilmente constatáveis.
Feita a escolha, me sinto leve, como o fundista que no sprinter derradeiro, vence seus oponentes, porque (já exausto) não se espera nada mais dele... Talvez, se for um vencedor, que seja alguém diferente, o que pode ser o caso.
Precisamos da crença de que “somos” diferentes, senão a vida seria insuportável.
Apresento agora a “vetusta senhora”. Desprovida dos cinco sentidos, portanto, entre outros, não enxerga, não fala e não ouve: a morte! Que, periodicamente, leva, de uma só vez, várias pessoas de uma mesma família, não fazendo nenhuma distinção particular: se homem ou mulher, se velho ou jovem. Diz-se que é o destino quando acontece com os outros e pouca importância se dá, embora os jovens sofram mais. Mas naquele ano foi a vez de nossas famílias... E éramos jovens.
Uma sucessão de imagens, um volume avassalador de quadros, lembranças, figuras, ações, sonhos, frustrações, conquistas, fracassos, pessoas indo e vindo, tudo se misturando e confundindo enquanto faço o café e aspiro aquele odor familiar, uma vida em segundos, inacabada e perversa, e no rádio, quase imperceptível, a voz do Gilberto Gil cantarolando “... Um dia vivi a ilusão de que ser homem bastaria”...
*
A música é essa:
“A Day in the Life”,
dos Beatles…
Em muitos lugares a canção sofreu restrições porque se supunha era uma apologia as drogas...
Na verdade, foi a primeira vez que Lennon e McCartney fundiram duas composições inacabadas de cada um...
Lennon havia lido o jornal dentro do ônibus sobre a morte de um amigo dos Beatles (num acidente de carro)... E rabiscou alguma coisa aludindo a outras notícias do mesmo jornal...
Paul McCartney anexou uns versos em que lembrava o fato de acordar cedo, fumar um cigarro e sair correndo para pegar o ônibus para ir para à escola...
Well, a fusão das duas partes gerou “A Day in the Life”... Uma bela canção... E claro, tanto o Lennon como o McCartney devem ter ficado surpresos com as “razões” de cada um para escrever o que escreveram e mais ainda, pelo “casamento” perfeito com os versos deles fundidos no resultado do trabalho...
Parece que até os equívocos favorecem os gênios, digo, aos homens de talento, ou será que é o contrário? (Olsen Jr.)
“A Day in the Life”,
dos Beatles…
Em muitos lugares a canção sofreu restrições porque se supunha era uma apologia as drogas...
Na verdade, foi a primeira vez que Lennon e McCartney fundiram duas composições inacabadas de cada um...
Lennon havia lido o jornal dentro do ônibus sobre a morte de um amigo dos Beatles (num acidente de carro)... E rabiscou alguma coisa aludindo a outras notícias do mesmo jornal...
Paul McCartney anexou uns versos em que lembrava o fato de acordar cedo, fumar um cigarro e sair correndo para pegar o ônibus para ir para à escola...
Well, a fusão das duas partes gerou “A Day in the Life”... Uma bela canção... E claro, tanto o Lennon como o McCartney devem ter ficado surpresos com as “razões” de cada um para escrever o que escreveram e mais ainda, pelo “casamento” perfeito com os versos deles fundidos no resultado do trabalho...
Parece que até os equívocos favorecem os gênios, digo, aos homens de talento, ou será que é o contrário? (Olsen Jr.)
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