31.3.12

.

S O L I D A R I E D A D E


Severo Cruz. Foto: Celso Martins

28.3.12

.

Emanuel Medeiros Vieira
Informação, cidadania e corrupção
.
Domingo de março
(Meditações sobre o cotidiano)

..
Amílcar Neves
Adélia e o seu pai Severo



INFORMAÇÃO,
CIDADANIA
E CORRUPÇÃO


Por EMANUEL MEDEIROS VIEIRA

As pessoas não dão atenção a certos modos de comportamento essenciais, como respeitar os mais velhos, obedecer a passagem de pedestres, a cordialidade no trânsito, a valorização do bem público”. (Gilberto Velho – antropólogo)

Há uma sobrecarga de informações, mas falta cidadania.
Como observou David Allen, a pessoa atualmente pode estar produzindo o mesmo que três antigamente, mas não está recebendo o triplo.
É claro que o mundo com informação e infinitas possibilidades, veio para ficar.
“O desafio é participar de forma produtiva nesse mundo novo e turbulento, sem ficar paralisado por ele”, acrescentou o jornalista.
No fundo: sem ser dele escravo.
Para muitos, a sobrecarga de informação recebida pelos usuários da internet está mais ligada ao consumo do que a produção.
“É preciso filtrar corretamente a informação que chega até você, porque, nos próximos anos, isso vai piorar”, afirmou Luli Radfahrer, professor de Comunicação Digital da USP.
“A água ainda está na cintura, mas é preciso ser rápido. Caso contrário, a água vai bater na boca, no nariz, na testa, e, aí, vai ser tarde demais”, arrematou.

A palavra cidadania vem do Latim “civitas”, que quer dizer cidade.
Ela designa, de modo geral, o conjunto de direitos e deveres que uma pessoa possui em determinada sociedade e também em relação ao Estado.
É o conjunto de valores morais que orienta os comportamentos dos indivíduos de um grupo ou de uma sociedade.
Também pode ser entendida como o campo da filosofia que reflete sobre os costumes e à moral.
Estamos muito mal nesse terreno.
Vemos isso nas ruas: na falta de civilidade, de cortesia, de gentileza. De educação.
O estresse e a agressividade predominam.
Nesse ambiente, a corrupção se multiplica.
A falta de respeito ao outro e ao bem público se traduz em números.
Dados da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) mostra que, numa estimativa realista, anualmente, a corrupção causa um rombo de R$50, 8 bilhões aos cofres públicos.
Com esse dinheiro, seria possível pavimentar 39 mil quilômetros de rodovia, construir 78 aeroportos ou oferecer rede de esgoto a 15,7 milhões de lares.

(BRASÍLIA, MARÇO DE 2012)



DOMINGO DE MARÇO
(Meditações sobre o cotidiano)

Por EMANUEL MEDEIROS VIEIRA

PARA LÚCIA HELENA SÁ

“Do rio que tudo arrasta, se diz violento, mas não se diz violentas as margens que o oprimem”.
(Bertold Brecht)
*

Apenas isso – nada napoleônico
domingo de março
microacontecimento
pássaros cantando naquela árvore (perto da janela) – sempre isso, e tão belo.
Tendo sorte ou não – dizia W. B, Yeats – o trabalho sempre deixa rastro.

Deus faz que me Esquece.
Depois Reaparece.

Já não preciso de bandeiras.
A vida – ela mesma, sempre – é a minha maior “bandeira”.
Não quero saber de engenhocas eletrônicas – apenas dessa existência.
Chegará um tempo em que o mundo todo terá se transformado em um homem de negócios?
Agora não importa.
A vida pode ser um processo de demolição.
É preciso saber driblar.
E – por que não? – amar.
(Uso o verbo como “arqueólogo” – que vai lá no fundo – para resgatar o verdadeiro sentido das palavras.)
Pai, mãe, filho, flor, mar, irmão, amigo, esperança – e paz.
(...) “Alguma (pouca) coisa que foi feita/ pode talvez merecer uma espécie/de não exatamente eternidade/mas mais do que o imediato esquecimento”.
(Paulo Henriques Britto, no livro de poemas “Formas do Nada”)

Apenas isso (e tanto): um domingo de março
céu azul
pão feito em casa
um café quente
e aquela árvore que continuará sempre ali.
Domingo de março...

*Mantenho a forma verbal ("se diz violentas") na tradução do verso de Brecht.)

(Brasília, março de 2012)


Imagens no campo do Triunfo (Sambaqui). Fotos: Celso Martins

Adélia e o seu pai Severo

Por Amílcar Neves*

Quando Adélia dos Santos Ferreira morreu, seus pais já estavam separados. Naquele tempo isso era muita coisa, essa coisa de separarem-se marido e mulher, pai e mãe casados, era caso para escândalo público e vergonha familiar. Na época, a mãe ficou na casa da Prainha, com sua religiosidade beata e a filha única que teimava em viver lendo e estudando, enquanto o pai se mudou para a Agronômica, onde morava amancebado, porém como cônjuge verdadeiro, com uma dona de nome Luzia.
A história da morte de Adélia, atropelada por um ônibus no meio da Ponte Colombo Salles, e das consequências desse trágico acontecimento foi contada em um livro publicado em 1984 e nunca mais reeditado, de título Dança de Fantasmas. O caso andou um tanto esquecido porque pouca gente leu o livro e - desgraça suprema para soterrar qualquer acontecimento! - o fato aconteceu justo num sábado de carnaval.
O fato referido no parágrafo anterior é a circunstância de que Adélia ejetou-se - ou foi ejetada - de um carro em movimento que transitava pela segunda pista da ponte; logo após aquele veículo, na primeira pista, a da beirada, aquela que corre olhando para a Hercílio Luz, ponte que naqueles anos ainda existia de pé, subia o ônibus que atingiu a garota plena e irremediavelmente, prostrando seu condutor em estado de choque. O carro em que a menina se encontrava perdeu-se no continente defronte.
Adroaldo Ferreira adorava aquela filha e era na casa do pai que Adelinha se sentia mais gente, como se diz, mais à vontade, com espaço para leitura, com estante repleta dos seus livros de estimação e sem a perseguição implacável do odor de vela santa, da umidade de água benta, da ameaça dos cruéis castigos eternos nem do rosário sempre rezado das obrigações eclesiásticas recorrentes. Foi daquele ambiente de vida e realização pessoal que ela saiu para encontrar a morte. O pai sofreu dor profunda, assim covardemente apunhalado pelo destino.
Tempos depois, já em 2003, a história foi filmada num curta-metragem de 18 minutos produzido pela Laine Milan e dirigido pelo Chico Caprario, levando o título As Diversas Mortes de Adélia - porque cada pessoa que conhecia a jovem de 17 ou 18 anos tinha a sua memória muito pessoal de Adélia e via uma razão ou justificativa muito própria para a sua morte: como se ela fosse ao mesmo tempo várias e todas tivessem morrido subitamente.
Severo foi o pai de Adélia no curta. Vendo-o preparar sua participação no filme, qualquer um era capaz de jurar que ali estava o personagem vivo, não um ator. Ali estava um pai completamente arrasado, destroçado, acabado, com as roupas e o rosto em desalinho pelo pesado golpe recebido: uma voz embargada, ainda que firme, uns olhos úmidos pousados na face idealizada da filha querida que se fora, uma expressão de dor difusa e autêntica a cortar-lhe os traços, um ser humano alquebrado e, naquele momento, totalmente desesperançado. A participação de Severo Cruz conferiu uma dimensão humana marcante ao filme.
Agora, em fevereiro deste ano de 2012, esse pai sofre novo golpe ao ver sua casa na Costa da Lagoa totalmente consumida pelo fogo. Amigos e admiradores se organizam e marcam um Tributo a Severo Cruz - Renascer das Cinzas, espetáculo com mais de 30 músicos, cantores e grupos musicais no palco do Teatro Pedro Ivo no sábado, 31 de março, para juntar dinheiro e comprar nova casa para o ator e também cantor.
E para que Severo continue a fazer o pai de muitas outras Adélias no cinema.

*Amílcar Neves é escritor e membro da Academia Catarinense de Letras (ACL). Crônica publicada na edição de hoje (28.3) do jornal Diário Catarinense (Florianópolis-SC). Reprodução autorizada pelo autor.

25.3.12

.

AGRADECENDO
A HOMENAGEM



Começo com a reprodução do Diploma do Mérito recebido sexta-feira (23.3) durante sessão solene da Câmara Municipal de Florianópolis, por indicação do vereador Dr. Ricardo acatada pelos colegas da Casa. É a terceira homenagem que recebo da Edilidade. A primeira foi a de Cidadão Honorário e a segunda o Diploma do Mérito Dakir Polidoro de Imprensa (Câmara/ACI).

Na mesma solenidade de sexta foram agraciadas pessoas conhecidas aqui na área, como o médico Jorge Abi Saab Neto e o artista e ativista cultural Cláudio Andrade (rua Caminho dos Açores/Praia Comprida, Santo Antônio), Maurício Meurer (presidente do Triunfo e intendente de Santo Antônio, residente em Sambaqui) e Dejair Lima (Pró-Cidadão/Engenho de Dentro), da Barra do Sambaqui.

Outros agraciados (sem demérito aos demais) que destaco: Tanira Piacentini (foi minha professora no Colégio de Aplicação da UFSC, toca a Barca do Livro na Lagoa), Teresa Barbosa (bióloga, perseguida por sua militância ambiental), Jeffrey Hoff (jornalista, também alvo de perseguições pela defesa do patrimônio natural e cultural da Lagoa e da cidade), Modesto Azevedo (ativista social), Rosângela de Souza (a Lelê da Novembrada, advogada, sempre altiva e lutadora), o professor da UFSC Luiz Fernando Scheibe.

Destaco por último o jornalista Nelson Rolim de Moura (Editora Insular), perseguido durante a ditadura militar-civil de 1964, desde os anos 70 em Florianópolis, a quem conheci na redação do jornal O Estado. "Agora ninguém vai dizer que sou gaúcho", disse com o diploma de Cidadão Honorário debaixo do braço.

Agradeço a todos que têm acompanhado o Sambaqui na Rede, a quem transfiro a homenagem recebida do Legislativo de Florianópolis. Foram os leitores e partícipes deste blog que me incentivaram a criar o Portal de Notícias Daqui na Rede, onde publico a cobertura da solenidade de sexta-feira, dia do aniversário da cidade, com 184 fotos de Velho Bruxo (Edson Luiz da Silva) e da jornalista Anita Martins. Aqui.

*

IMAGENS AVULSAS


Catléya Labiata, presente do geógrafo e orquidófilo
do primeiro time Marcelo Vieira Nascimento,
sobre quem falaremos ao longo da semana


Casario de Sambaqui visto do mar

Da janela de casa








Fotos: Celso Martins

22.3.12

.

A G E N D A

*

*


*

21.3.12

.


S u b i t a m e n t e

Por Amílcar Neves*

De súbito fez-se noite. De um momento para outro estava escuro que nem breu. Algumas estrelas brilhavam, uma lua se insinuava para breve mas não tanto, pois a fase era minguante e, minguando, ela só surge mais tarde, cada vez mais tarde até praticamente não mais surgir quando se faz nova. Nova, não passa de esboço de lua no céu diurno, uma coisa pavorosa. Não se sabe de esboço de sol no céu noturno.
Fora as estrelas e a promessa de lua, a rua tomava-se da luz esfuziante dos carros, dos postes, das casas (cada vez menos), dos apartamentos (cada vez mais e mais altos). Mas era noite. E era escuro. Disto ninguém duvidava, pois tinha de fato anoitecido assim de repente.
Em verdade, não foi bem assim, se fores honesto conosco e contigo mesmo - o mais difícil, e cada vez mais, é encontrar honestidades vagando por aí. De tão raras no pedaço, são disputadas a tapa, a socos e pontapés, para que aprendam de vez a serem desonestas e safadas como todo mundo. Que é isso de andar honestamente por aí? Pensas que isto aqui é a casa da mãe joana para te fazeres de santo? Ainda mais: fazer-te de honrado, digno e decente em ano de eleição municipal? Era o que me faltava - o que nos faltava -, tem a santa paciência!
O fato é que te embrenhaste pelos meandros de um desses grandes mercados que espalham por aí, e lá tinhas ido, sabes, apenas para comprar um pão decente e honesto, mas decidiste te perder absurda e irresponsavelmente a esquadrinhar a prateleira de doces e chocolates como se te fosse dado consumi-los assim sem um motivo muito consistente e inarredável. Ao saíres, ao cabo de todos os procedimentos inerentes ao mercadejamento capitalista, a noite se fizera, se fechara frente aos teus olhos surpresos.
Olhaste então para o outro lado da rua e viste a fazendola que ali esteve pelos últimos 35 ou 40 anos, tempo durante o qual sempre te propuseste a fotografá-la antes que o dono a vendesse, antes que os herdeiros a torrassem (para comprar carros e fazer festas e ficar sem nada em pouco tempo, bem menos do que esses 35 ou 40 anos em que ela resistiu com seus bois e vacas, suas galinhas e plantações, para o trabalho solitário do pobre velho já doente mas teimoso, teimoso até morrer, como diziam sempre suas noras, genros e cunhados que não se conformavam de saberem-no com uma mina de ouro nas mãos e, no entanto, disposto a sair no frio, na chuva e na lama para tratar do gado como se isso fosse serviço de gente). Mas não, nunca pegaste uma câmara, sequer teu celular de baixa resolução, para fazeres as fotos que sempre te prometias e ali estava, agora: subitamente tudo viera abaixo.
Já não havia mais fazenda, mas uns lotes enormes marcados para a construção de prédios residenciais enormes, com nomes como Maison de France ou coisa assim, com 12, 14, 16 andares para tapar a vista dos morros em volta e com a finalidade única de derramar mais e mais carros, com crianças para a escola e adultos para o trabalho, nas ruas estreitas de sempre que há muito já não davam conta de escoar tanto veículo, onde nem o transporte público, raro, precário e caro, conseguia circular.
Subitamente as coisas mudaram - mudam -, assim como subitamente um dia morrerás - morreremos -, e já devias te dar por satisfeito de não teres sido abortado de aborto espontâneo ou provocado. A partir dali, tudo aconteceria de súbito na tua vida: pouco a pouco, devagar, construindo-se - mas ainda assim dizes que aconteceu tudo tão subitamente que nem tiveste tempo.


*Amílcar Neves é escritor e membro da Academia Catarinense de Letras. Crônica publicada na edição de hoje (quarta, 21.3) do jornal Diário Catarinense (Florianópolis-SC). Reprodução autorizada pelo autor.

Praia do Quilombo (Santo Antônio de Lisboa) em detalhes.
Fotos: Celso Martins


20.3.12

.

Afeto e Abusos
(Emanuel Medeiros Vieira)
.
Primeiro
amanhecer
do outono

(Fotos de Celso Martins)
.
Ato em defesa
da Ponta do Coral

.


*

A F E T O

Por Emanuel Medeiros Vieira

"Se não for pela poesia, como crer na eternidade?”.
(Alphonsus de Guimaraens Filho)

Sobra este afeto
(a muralha que me resta).

Sim, é este patrimônio que me cabe-
sem valor contábil,
o que amo,
contra o ruído, o mal e a bofetada.

Tribo perdida,
só queremos saber de nós mesmos.

Minha verdadeira cidadela é o território dos afetos.
transformado estou: no guerreiro que não me
imaginava mais, exaurido: ainda assim combatente.

Restaurado o menino que viu a regata:
é esta matéria mnemônica que tento re-fundar aqui,
papel em branco, nova manhã.

O latim do colégio ensinava que “recordar” vem de:
“recordis”:
tornar a passar pelo coração.
(A poesia perpetuará esta fugaz manhã, despistando a
morte?),
vem, menino, sossega o coração na manhã azul,
me legitima na palavra escrita,
eterniza o poema para os que vierem depois:
é minha oferenda (o sentido desta peregrinação).

*



*

A B U S O S

Por EMANUEL TADEU MEDEIROS VIEIRA

GRIFES DO ESPORTE SÃO ACUSADAS DE ABUSO
(TRABALHADORES DE FORNECEDORES DE NIKE, ADIDAS E PUMA NA ÁSIA RELATAM MAUS-TRATOS E ASSÉDIO SEXUAL)


Matéria publicada no “Guardian”, assinada por Gethin Chamberlain, revela que operários que produzem material esportivo para Adidas, Nike e Puma, patrocinadoras de várias equipes olímpicas, “são surrados, sofrem abusos verbais, recebem salários medíocres e são forçados a trabalhar por períodos excessivos em fábricas de Bangladesh, revelou uma chocante investigação”.
O texto informa também que “operários das três companhias foram espancados, empurrados ou tiveram seus cabelos puxados pelos chefes”.
Mulheres que trabalham em fábricas da Adidas e da Nike em Bangladesh teriam sofrido assédio sexual, e operários das três empresas tiveram que trabalhar por períodos superiores ao máximo permitido pela lei e por salários inferiores ao mínimo.
Trabalho quase igual ao escravo?
Trabalhando com a organização “War on Want” e pesquisadores de Bangladesh, o jornal “Observer” constatou que operários já haviam sido espancados e humilhados.
A Adidas é fornecedora oficial de material esportivo para a Olimpíada de Londres e produzirá para a equipe britânica uniformes criados por Stella MccCartney. Também fornecerá uniformes dos 70 mil voluntários dos jogos.
A Adidas planeja vender 100 milhões de libras de material com tema olímpico.
A Nkke patrocina 25 equipes olímpicas, como Alemanha, China e EUA.
A Puma fornece material para Usain Bolt, ouro nos 100 e 200 metros em Pequim–2008.
Greg Muttitt, diretor e campanhas na “War ou Want”, declarou que “companhias como Adidas, Nike e Puma têm imensos lucros com esses abusos e açulam o estandarte olímpico com o qual se cobrem”.
As grifes do esporte se defenderam das acusações, mas a Adidas disse ter identificado, em 2011, “questões críticas” em uma fábrica em relação à jornada de trabalho e salários, o que resultou em medidas disciplinares”.
A Puma afirmou que teria encontrado provas de horas extras ilegais em um de seus fornecedores, mas que a fábrica havia oferecido garantias de que corrigiria o problema.
Mas a “War ou Want” afirma ter provas de que os operários não ganham o que mandaa lei.
Seria esse o tão decantado espírito olímpico, de respeito, fraternidade e união entre os povos?


AZIS AB’SABER

Os legisladores brasileiros – principalmente os envolvidos na discussão do novo Código Florestal –, deveriam ler a biografia de Azis Nacib Ab’Saber, pesquisador da USP (Universidade de São Paulo), falecido em 16 e março.
“Sua vida foi dedicada à biodiversidade do país e à preservação ambiental”, disse alguém.
Humanista, foi presidente durante anos da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência – SBPC (cujos congressos na década de 70 – e outros – foram uma lição de cidadania e de esperança na nossa luta e de tantos companheiros contra a ditadura militar).
Morreu, sem ver protegido o meio ambiente,assistindo o crescimento desordenado do agronegócio, e vendo o nosso país na primeira posição no uso de agrotóxicos.
Mas sua luta não foi em vão. Numa época – como disse alguém –, em que “a maioria se envergonha com o dia a dia da vida pública, onde os culpados são cada vez mais ostensivos, e os justos cada vez mais raros”, ele deixou um nobre e belo legado de honradez, dedicação, extrema competência e humanismo.

(BRASÍLIA, MARÇO DE 2012)




*

ATO SEXTA-FEIRA,
23 de março de 2012



16.3.12

.

Na orla de Sambaqui:
Praia do Fogo.

Fotos: Celso Martins

*

BRASÍLIA:
PATRIMÔNIO AMEAÇADO

(E SOB A INSPEÇÃO DA UNESCO)

Desenho de Oscar Niemeyer. Reprodução: Celso Martins


Por EMANUEL MEDEIROS VIEIRA

Projetar Brasília para os Políticos que vocês colocaram lá, foi como criar um lindo vaso de flores para vocês usarem como penico. Hoje eu vejo, tristemente, que Brasília nunca deveria ter sido projetada como forma de avião, mas sim de Camburão”. (Oscar Niemeyer)


Desembarcaram em Brasília no dia 13 (terça-feira) deste mês, dois especialistas indicados pela Unesco para visitar a cidade e analisar as irregularidades espalhadas pela capital federal.
A missão – como lembra a jornalista Helena Mader – foi solicitada pelo Centro do Patrimônio Mundial da Unesco, em Paris, devido às inúmeras denúncias de agressões à concepção da cidade.
As autoridades brasileiras e representantes do GDF (Governo do Distrito Federal), como do governo federal, precisarão dar satisfação à Unesco em relação às ilegalidades.
Um dos eixos do trabalho será o relatório produzido em 2001, quando Brasília recebeu a última visita da instituição

O Plano original do Plano Piloto tem sido constantemente deturpado e violado: fizeram “puxadinhos”, pilotis foram cercados, construíram coberturas irregulares, invadiram áreas e terras públicas. E muito mais.
Os especialistas (o argentino Luís Maria Calvo e o espanhol Carlos Sambrício) também querem analisar legislações relacionadas à preservação do patrimônio, como o Plano de Preservação do Conjunto Urbanístico de Brasília (PPCUB), apresentado no mês passado e o Plano Diretor de Ordenamento Territorial (Pdot), cujo projeto de revisão está parado na Câmara Legislativa (basta a última informação para causar arrepios...).
Depois da visita, os especialistas terão até 6 de abril para elaborar o relatório relativo à missão.
O documento será entregue no Centro de Patrimônio Mundial e também deve ser encaminhado para debate na reunião anual da Unesco, que será realizado em julho deste ano, na cidade de São Petersburgo, na Rússia.
Na primeira visita, representantes da organização pediram pressa ao governo local para ser criada uma zona de proteção ao redor da área classificada como patrimônio mundial e recomendaram que o governo desse prioridade à elaboração de um plano diretor para a região protegida.
“As medidas só começaram a sair do papel no mês passado, com atraso de mais de uma década e às vésperas da chegada segunda missão a Brasília”, lembra Helena Mader.

Brasília surgiu a partir do cruzamento de duas linhas.
Como observou alguém, a simplicidade do traçado de Lúcio Costa é a essência do Plano Piloto.
Há exatos 25 anos, a importância dessas ideias inovadoras foi reconhecida e a cidade recebeu o título de Patrimônio Mundial a Humanidade.
“Mas hoje a leveza do desenho de Brasília, vencedor do concurso que escolheu o projeto da nova capital, contrasta coma vulgaridade e com a falta de padronização das construções irregulares”, sublinha um observador.
Os problemas dos brasilienses ganharam dimensão internacional e serão escancarados para o mundo inteiro.
Um triste exemplo: a quantidade de edifícios acima da altura permitida chama a atenção e mudou completamente a paisagem a antiga área dos pioneiros.
È a ganância, a cobiça, a corrupção disseminada, péssimos governos, o espírito predatório de muitos “construtores”, e uma classe política que é uma das piores do Brasil.
Não é queixa nostálgica.
É a qualidade de vida das próximas gerações que também está em jogo.
Quero dizer: é a própria vida que está em jogo.*

*Na redação do texto, utilizei trechos de matérias publicadas sobre o assunto em jornal da capital, de autoria de Helena Mader.

(Brasília, março de 2012)

*

NA ORLA DE SAMBAQUI

Imagens da praia do Fogo

Por Celso Martins














14.3.12

.


A notícia mais
importante
da semana


Por Amílcar Neves*

Para um bom punhado de gente, tanto contra como a favor, a melhor notícia da semana foi a informação de que o Ministério Público Federal trabalha há tempos para indiciar acusados por crimes cometidos durante a ditadura como autores de sequestro e ocultação de cadáver. Sequestro e ocultação de cadáver são crimes permanentes, ou seja, continuam a ser cometidos até que os corpos apareçam ou que se saiba o que de fato aconteceu. Como a Lei da Anistia abrange o período de 1961 a 1979, os responsáveis pelos desaparecimentos ocorridos naqueles anos estariam ainda hoje cometendo os crimes e, portanto, colocando-se ao desabrigo da referida Lei que tanto lhes vale.
A turma de pijama - oficiais da reserva, militares reformados e civis aposentados - está esfregando as mãos: "Se somos agredidos e atacados, temos o direito divino de nos defender", e pensa em sequestrar, eliminar e ocultar mais arquivos da época e acelerar os planos de um novo 1º de Abril redentor. "Vamos botar ordem na tropa! Ou isto aqui é uma manada?"
Mas estão todos redondamente enganados (redondamente enganado é expressão muitíssimo anterior às campanhas publicitárias que rolam por aí). A notícia mais promissora da semana é uma fria: vem da Groenlândia.
Erik, o Vermelho, um viquingue da gelada Islândia, exilado do seu país por ter assassinado um vizinho, foi condenado a passar três anos naquelas terras hostis - melhor, naqueles gelos hostis, já que o gelo cobre 84% do território da maior ilha do mundo; será a segunda maior se considerarmos ilha a Austrália, praticamente um continente inteiro.
O islandês assassino chegou ao destino em 985 com uma tal caravana que lhe permitiu pensar na colonização do pedaço. Se vai haver colonização, dois requisitos são indispensáveis: braço colono para amanhar as terras e nome da colônia para todo mundo saber onde é que ela fica. Em atenção a esta segunda necessidade saiu o nome que Erik, o Vermelho, deu à ilha: Terra Verde, que é o que significa Groenlândia. Sendo verde a terra, ficava mais fácil convencer, ou induzir, ou ludibriar o candidato a colono a empreender enorme viagem pelos mares gelados vizinhos ao Ártico.
Como se vê, data de mais de milênio o uso de propaganda enganosa.
Mas o que nos veio de tão bom esta semana lá da gélida Verdelândia?
Veio a notícia, no domingo, de que a Groenlândia está derretendo e que o derretimento completo - completo! - da sua camada de gelo se fará com temperaturas mais baixas do que antes se pensava (só isto causará o aumento do nível do mar em 6,4 metros). Estimava-se que essa liquefação total da cobertura groenlandesa aconteceria quando a temperatura global subisse de 1,9 a 5,1 graus acima daquela que se media quando não havia indústrias sobre a face da terra. Recentes estudos rebaixaram essa faixa para 0,8 a 3,2 graus, com robustas estimativas de que o ponto de fusão total ocorra aos 1,6 graus - hoje, o aquecimento global já atingiu 0,8 graus desde a Revolução Industrial.
O bom da história, além de virmos a ter no futuro mais água para navegar, é que vastos territórios se abrirão para a Engenharia brasileira, conduzida pelas caçambas das grandes empreiteiras nacionais que vivem a vasculhar o planeta: a Groenlândia mede um quarto da superfície do Brasil e, descascada, verde, revelará paisagens de tirar o fôlego, nunca dantes vistas, virgens para a construção de um inferno de obras no atacado.
É ou não é coisa de se comemorar com júbilo empreendedor?

*Amílcar Neves é escritor e membro da Academia Catarinense de Letras (ACL).
Crônica publicada na edição de hoje (14.2) do jornal
Diário Catarinense
(Florianópolis-SC). Reprodução autorizada pelo autor.




*

RADICAIS NA ÁREA

Erich Grosner, na prancha, e Gustavo Dorneles Raffler, piloto, praticando o wake surf (foto) e o wake board na praia da Flores (Sambaqui). Foto: Celso Martins. Mais detalhes no Portal de Notícias Daqui na Rede.

*

Casarios do Sambaqui. Fotos: Celso Martins

12.3.12

.


SEM TRUQUES
Poema de Emanuel Medeiros Vieira

Texturas, formas e viventes
Fotos de Celso Martins



*

SEM TRUQUES1

SEM TRUQUES

Por EMANUEL MEDEIROS VIEIRA

Para meus irmãos

“Deus Meu! Em que século – ou em que mundo – me fizestes nascer!”
(São Policarpo – Bispo de Esmirna, mártir e discípulo de São João Evangelista)
Ouvindo “Quem Sabe” (Carlos Gomes), com Francisco Petrônio e Dilermando Reis.

O século nasceu velho.
Sem truques – só magia –
aprendi a me despedir de tudo
– colecionador de funerais –
Eternizarei (palavra esculpida na pedra) quero eternizar o canto de um pássaro que agora (para sempre?) escuto?
É para isso que aqui estou.

Dor crônica no pescoço?
É porque você foi enforcado em outra encarnação – garantem alguns.

Exaltação, melancolia, espera – o Nada –, o Tempo queimando,
a Palavra tentando driblar a Dessacralização desta vida.
(Mercantis tempos.)

“Está te faltando humor” – berra um diabinho interior.

Mas a vela continua acesa.

Perdeu importância a literatura?
Ela já não sintoniza as consciências.
E há livros demais:
hierarquizar é preciso.

Na TV, a hiper-realidade é tão perfeita
que toda experiência real parece sem graça.
Tudo é simulacro?
Não as Parcas.
Somos tão frágeis?
Somos tão fortes?
Ou não somos?
Poucos de nós não nasceram para o rebanho.
Envelhecemos, passamos, vai-se a carne – e O Espírito sopra onde quer.
A vida foi mais que nada.

(Brasília, março de 2012)

*

Texturas, formas e viventes

Por Celso Martins



Barba de velho. Usada na decoração de presépios de Natal. (1, 2)











Baiacu.

1) Barba de velho. Tillandsia usneoides. Planta da família das Bromeliaceae. Também conhecida como barba-de-pau, samambaia, barba-espanhola, barba-de-macaco, barba-de-pai-ventura, barba-de-pau, cabelos-do-rei, camambaia, crina-vegetal, erva-dos-bardonos, samambaia-de-norte, hirahuasso. Saiba mais.

2) "Barba-de-velho mede poluição - Espécie de bromélia é usada para captar metais pesados no ar". Por Evanildo da Silveira. Revista Pesquisa (Fapesp).