19.9.11

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O ESCRITOR E EU



Flores da casa (Celso Martins)

Por Olsen Jr.

Falando sério, às vezes (muitas vezes ultimamente) tenho entrado em conflito com o escritor que me tornei. Não é a pergunta retórica sobre “o que você faz?” que me incomoda, a esta respondo simplesmente, sou um escritor... Mas deveria haver uma maneira mais tranqüila de se ganhar a vida honestamente...

Surpreendo-me conversando com ele:

– Não está sendo fácil! – Exclamo em tom de desabafo.

– Ninguém disse que seria – ele me responde, laconicamente

Fico esperando para que desenvolva a ideia de como deveria ter sido, mas ele se limita em pegar uma folha de papel e ler:

“... mas, no entanto todos sabiam que – no picadeiro da vida – somente aos palhaços não é dado esquecer o seu drama, executando com esmero sua função de provocar o riso.

“Este, que venha de onde vier. Surja dissimulado nos corações empedernidos, flua com espontaneidade nas mentes puras, brote fácil nos espíritos sensíveis, faça-se notar pelos indiferentes, e sob a lona deste imenso circo da humanidade, nunca deixe de existir.

“Conviva com feras anacrônicas, catástrofes irremediáveis, destinos programados ou a incredulidade no desconhecido, mas que enquanto houver um homem na platéia, uma criança que o justifique e um poeta para cantar, nenhum clown tenha o direito de purgar suas dores em público.

“Devendo, isto sim, ouvir palavras de escárnio com desdém, seguro do personagem que deve interpretar, conviver com todo o drama que carrega e ninguém vê, avançar tateando nas sombras da solidão sem esperança ou sentir o gosto amargo do desprezo quando o espetáculo termina, pelo papel que assume e pela arte que cultiva.

“Diante da multidão impaciente, o espetáculo deve sempre continuar, porque de um grande palhaço, o que se quer mesmo é rir! Gargalhar bastante e tanto, que o nosso riso se confunda com o seu pranto, para que não se saiba, no final, se rimos da tragédia que a grandeza da atuação deste palhaço dissimula ou se é ele quem chora pela pequenez do riso que nos provoca!”...

– Bonito! – De quem é?

– É teu, meu caro – ele me responde – encontrei-o nas páginas de um livro inacabado...

– Forço um riso, penso, sou o campeão dos sonhos irrealizados e dos desejos insatisfeitos...

– A tragédia do palhaço é fazer rir enquanto ele está morrendo... E a do escritor é recriar o mundo, onde ele não tem direito a desesperança - pondera...

Ele não precisava ficar lembrando o meu ofício...

– Sei do que se trata – interrompo-o – o escritor vai bem, mas preciso cuidar melhor do homem comum que eu sou... Aliás, estou pensando em montar uma barraquinha para vender churrasquinho na praia neste verão, o que você acha?

– Well, o homem que alimenta o escritor também precisa viver, conclui!




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