12.12.11

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F E S T I V A L
Olsen Jr
Emanuel
Medeiros
Vieira

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B A R C O


Por Emanuel Medeiros Vieira


Tenho me convivido muito ultimamente e descobri com
surpresa que sou suportável, às vezes até agradável
de ser. Bem. Nem sempre”. (Clarice Lispector)

Nesta foto do tempo de criança/o que mais me encanta/não é
nossa alegria de infantes/mas a réstia de luz de uma manhã/brilhando
no chão de uma varanda// Ninguém apaga este sol que
nos chega da infância”. (Miguel Sanches Neto)


Meu barco me levará até o teu sonho.

Mapeio territórios, procuro bússolas, cartas de navegação.

Velas ao vento– singrando os Sete- Mares.

(Não quero ser o navegador do Apocalipse.)

O barco segue comigo – como o mar.

A vela só vale acesa.

E neste barco, penso em regatas e domingos azuis.

Voltarei a colher flores nas manhãs orvalhadas?

Vai, meu barco – esta jornada.

(Cantil cheio, pão de centeio.)

Segue, meu barco!

Segue.

Os veros viajantes estão no exílio?

Não quero só pranto – mas a redenção.

Navega com o meu barco – coração –, navega.

Alvíssaras!

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NOVAS CARTAS BAIANAS
SALVADOR

Por Emanuel Medeiros Vieira


Entre as décadas de 40 e 60 do século passado, Salvador foi um dos maiores polos culturais do Brasil.

A cidade caracterizava-se por “uma efervescência criativa impressionante”.

Edgar Santos, na Universidade Federal da Bahia (UFBA) era o grande timoneiro – na expressão de Fredie Didier Jr. –, trazendo para a primeira capital do Brasil, figuras como Agostinho da Silva, Eros Martins Gonçalves, Lina Bo Bardi, Ernst Widmer, Hans Koellreutter, Lia Lobato e Yanka Rudzka. Podiam também ser vistos na cidade, Diógenes Rebouças, Walter da Silveira (que tive o imenso prazer de conhecer e de passar uma tarde conversando com ele, na capital baiana, em 1966), Caribé, Jorge Amado, Pierre Verger, Mário Cravo, Floriano Teixeira Pancetti, Machado Neto e Milton santos – que se tornaria um dos maiores geógrafos do mundo.

Entre o final do anos 50 e início dos 60, apareceriam a Tropicália, o Cinema Novo (claro, não especificamente na Bahia), mas tendo o baiano Glauber Rocha como um dos seus maiores incentivadores.

“De alguns anos para cá, Salvador parece que perdeu o viço”, detectou alguém.

Violência, caos no trânsito, sujeira – espécie do modelo brasileiro dominante.

A cidade que “começou a existir para que o Brasil existisse”, na observação de um analista – apequenou-se.

“Temos de reconstruir a semântica da nossa convivência”, reivindica alguém.

Quem sabe, como disse um conhecido compositor,, ‘a seta’ da cidade acerta o caminho e chega lá”.

Nessa canção, Caetano Veloso dirige-se à cidade e pede a ela que insista no que é lindo e, então, “o mundo verá tu voltares ao lugar que é teu no globo azul, Rainha do Atlântico Sul”.

Não a Salvador “abandonada, esburacada, suja, cheia de drogados e vândalos, mendigos e assaltantes”, no dizer de Hélio Pólvora – que se orgulha de ser subsede da Copa do Mundo de 2014.

“No grito do gol, teremos um orgasmo coletivo”, arremata ele.

O alcaide da caótica e desgovernada Salvador está deslumbrado com a Copa. Como o governador, os tecnocratas, os aproveitadores de sempre além dos políticos – toda essa gente que não te merece, Salvador!

Todas as obras de infra-estrutura urbana e de transportes, que interessam diretamente à população, estão atrasadas.

Melhor uma cidade civilizada, humana, com saneamento básico, convivência digna, transportes coletivos de nível, do que a efemeridade de uma Copa – que apenas enriquecerá ainda mais corruptos de sempre.

Um dia, quem sabe, “Rainha do Atlântico Sul”, “o mundo verá tu voltares rindo ao lugar que é teu no globo azul”. (...)

(Salvador, dezembro de 2011)

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AS MULHERES AO REDOR

Por Olsen Jr.

Estou na cama. As dores provocadas por uma crise de gota não se justificam, uma vez que sequer estou bebendo, mas o médico me irá esclarecer. O que importa agora é a constatação de que os meus atos passaram a ser pautados pela presença invisível de várias mulheres...

Batem à porta. Vou manquitolando atender pensando que o médico chegou cedo. Para surpresa minha, recebo a visita do jornalista, Valdir Alves. Chega com duas garrafas de vinho. Um dos meus poucos amigos, o Valdir “é da casa” como se diz, explico a situação e volto para o quarto. Ele aparece em seguida, puxa uma cadeira e senta-se ao lado da cama. Vai bebendo o seu “Cassillero Del Diablo” enquanto relato o que me atormentava antes dele chegar: as mulheres!

Ele escuta com um sorriso malicioso e certo brilho no olhar, percebo que está interessado e exponho o tal assédio. “Veja o caso da Dolores, por exemplo, vem aqui em casa, é metódica, fica ali no pé da cama, à minha direita, quase imperceptível, preciso me esforçar por dar por ela; depois tem as gêmeas, Janice e Janete, são tímidas, me lembra a minha infância, quando chegavam pessoas estranhas, a gente corria para se esconder, pois bem, elas ficam ali atrás daquela porta de vidro, espiam, fazem algum ruído e crêem que me divirto com isso, não digo que não, mas é curioso; tem a Gioconda, mais pretensiosa, metida a intelectual, ela prefere aquele nicho entre o balcão e a escrivaninha, já a surpreendi bisbilhotando os meus escritos, faço que não sei, mas sei. Não gosto quando vem acompanhada das três filhas, que já apelidei de Lalá, Lelé e Lili, uma alusão às sobrinhas do Pato Donald, porque são enxeridas, ficam bulindo os tabuleiros de xadrez, aquele de vidro (que ganhei do Horácio Braun) e aquele artesanal (presente do artista Telomar Florêncio), preciso intervir, quando então “as queridinhas” se contentam em pular em cima do tapete aqui em frente da minha cama...”

O Valdir continua sorrindo e esperando para ver onde aquela conversa iria dar. Como não diz nada, continuo: “Aí vem a Domitila, caseira, prefere ficar lá na cozinha, não sai da frente do fogão, tudo bem se gosta disso, penso; mas a mais terrível é a Claudia Castañeda, não precisa rir, porque parece que ela está sempre “chapada”, demorei em entender que aquele era o “seu jeito”, e com todo o respeito, há muito deixei de pretender reformar o mundo, mas o “duro” são as amigas, a trupe quando resolve reunir-se em frente da televisão. Abstraindo a Dulcinéia que prefere a permanência ao lado da escultura do Dom Quixote na sala, as outras tartamudeiam todas ao mesmo tempo sem o menor decoro; a Angélica prefere o espaldar do sofá, esbaforida e barulhenta, a Genoveva, aristocrática só no nome, foi reprimida em outros tempos, mas ali se esbalda e parece que se multiplica; A Christininha, uma incógnita porque a chamo no diminutivo, parece três e açambarcar toda a mesa de centro quando resolve se manifestar. Quer saber? Parece um bando de peruas planejando um assalto...”

Nesse ínterim, a chuva recrudesce, ouvimos um estalo seco ao lado da cama. O Valdir indaga: “o que foi isso?”. Digo que é apenas o espraiar guloso de uma gota de água estatelando-se num pote de sorvete que ele não pode ver e concluo: “esta é a Dolores, de quem já falei, e que acaba de chegar”.

Ele começa a rir... Digo que todas as goteiras aqui em casa têm nome de mulheres...

Está rindo é? A coisa é séria. Dia desses uma amiga esteve aqui com o filho, e quando soube disso, pediu para ser homenageada. Pensei na goteira na sala que cai em cima de uma cadeira de couro e faz um som diferente. Disse a ela e que seria a primeira batizada com o nome de alguém conhecida: Georgia! Que bom afirma, assim você pode pensar em mim, lembrei do Ray Charles,e tasquei, claro, sempre: “Georgia on my Mind”!





A canção é essa, “Georgia on my Mind”,
música de Hoagy Carmichael com letra de Gorvel Stuart (1930) que escreveu-a para a irmão de Hoagy, chamada Georgia Carmichael...

A letra, no entanto, foi suficientemente ambígua para se reportar tanto ao Estado da Georgia (USA) como a mulher chamada Georgia, que foi a homenageada pelo compositor...

Ray Charles a gravou em 1960.

A canção também foi reverenciada pelos Beatles em “Back in the USSR”, com o verso “A Georgia está sempre em nossa mente”, alusão ao RSS, da Georgia (Georgia Soviética)...

Muitos intérpretes gravaram a música, Billy Holiday, Aretha Franklin, Willie Nelson...

A minha versão favorita é a de um grupo sul-africano que fez muito sucesso na década de 1970, chamado “The Square Set”, gravou “Georgia on my Mind” em ritmo de rock... Eles também ganharam notoriedade pela canção “That’s what I want”... Infelizmente, por razões que desconheço, não consigo encontrar a dita cuja no Google... Tenho o compacto simples aqui comigo, uma preciosidade, mas é outra história...

Fica a versão do soul man, Ray Charles, clássica, se vocês me entendem... (Olsen Jr.)


Dama com um Arminho, retrato de Cecilia Gallerani.
Leonardo da Vinci. Czartoryski Museum. Domínio Público

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Fotos da Ponta do Sambaqui, domingo, 11.12.2011. Por Celso Martins

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