2.8.10

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Estaleiro e coerência
Atila Rocha dos Santos

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Imbituba: Missa
contra o despejo

Rui Fernando da Silva Neto
e Pepe Pereira dos Santos
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A luta pelo Bar do Chico
Elaine Tavares

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Cinema italiano
Ciclo Vittorio De Sica


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Praia do Fogo. Sambaqui (Florianópolis-SC), 30.7.2010. Foto: CM

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ESTALEIRO OSX
Fim do silêncio

Secretário municipal e superintendente do
IPUF, Átila Rocha dos Santos. Foto: CM

O secretário municipal de Habitação e Saneamento Ambiental e Superintendente do IPUF, Atila Rocha dos Santos, rompe o silêncio da Prefeitura Municipal de Florianópolis em relação ao Estaleiro OSX e aconselha a instalação do empreendimento em outro lugar. Ele também respalda o parecer do ICMBio e denuncia o silêncio da militância dos partidos políticos (sebretudo do PT) em relação ao projeto.

É possível que depois de Atila Santos outros integrantes do Executivo municipal façam o mesmo, principalmente o prefeito Dario Berger, que se mantém num silêncio sepulcral Na Câmara Municipal, até o momento, apenas os vereadores Ricardo Vieira e Renato Geske se pronunciaram contra o estaleiro no local previsto. Outros vereador, Jaime Tonello, vê com desconfiança a iniciativa na Baía Norte de Florianópolis.

Confira a seguir na íntegra o pronunciamento de Atila Rocha dos Santos encaminhado ao Sambaqui na Rede.

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ESTALEIRO DA OSX - UMA
QUESTÃO DE COERÊNCIA


Por Atila Rocha dos Santos

Inicialmente devemos enaltecer e nos solidarizarmos com a posição coerente do ICMBIO Regional, ao se declarar contra a implantação do Estaleiro em Biguaçu. Um órgão que foi contra a nova ligação do Aeroporto Hercílio Luz porque teria que atravessar uma região com 1km de mangue da Reserva Extrativista do Pirajubaé; foi contra o lançamento de efluentes da estação de tratamento de esgoto no Rio Tavarez, mesmo tendo tratamento primário, secundário e desinfecção, na mesma região e também é contra a legalização de lotes do Balneário Daniela, mesmo após a implantação das ruas, da rede de abastecimentos de água e de energia elétrica, devido a proximidade com a Reserva Ecológica dos Carijós. É evidente que o ICMBIO local, não poderia ser favorável a construção de um estaleiro deste porte, justamente em um local dentro da Área de Influência desta mesma reserva, da APA de Anhatomirim, e da Reserva Biológica da Ilha do Arvoredo. É como dizemos a principio “ uma questão de coerência”.

A incoerência está neste caso, na atitude de candidatos que participarão das próximas eleições, em campanhas milionárias, terem pedido a cabeça dos servidores do ICMBio local e a transferência da decisão do caso para Brasília, sob a alegação de que o pessoal de lá tem mais experiência para tratar desse licenciamento. Sem dúvida podemos admitir estarmos diante de uma influência político-eleitoreira, as vésperas de um pleito que vai eleger os cargos mais importantes da Republica.

É muito curioso, constatar que a militância de alguns partidos, aliados no próximo pleito e normalmente tão combativos nos demais licenciamentos ambientais, esteja muda, calada e amordaçada quando se trata do Estaleiro da OSX, que sem duvida trará grandes benefícios para Santa Catarina, incontestáveis pela grande maioria das pessoas que participaram das três audiências públicas, mas que se instalado no local pretendido, e o improvável ou o imprevisto acontecerem, poderá ter como consequências o comprometimento da pesca artesanal, da maricultura e da atividade turística em toda região. Quantos empregos serão gerados já sabemos, mas quantos serão perdidos ninguém sabe.

Foi o improvável que ocorreu no poço de petróleo da BP no Golfo do México, que já derramou mais de 700 milhões de litros de petróleo no mar, matando milhares de animais, atingindo a costa de cinco estados americanos e gerando prejuízos de 17 bilhões de dólares. Ou alguém acredita que esta catástrofe estava nas previsões da empresa? Foi o improvável que aconteceu em Pernambuco , quando após a construção do Porto de Suape, os banhistas das praias de Recife começaram a sofrer ataques de tubarões, o que era raríssimo no Brasil. Hoje sabe-se que o local escolhido para implantação do Porto era normalmente utilizado para a procriação de tubarões que após as alterações do meio natural, migraram para as praias de Recife, afetando o turismo em toda região.

Na visão das pessoas que são contra a instalação do Estaleiro naquele local, está o medo do improvável, diante da magnitude do empreendimento a ser construído. É justamente a grandeza do investimento, da ordem de três bilhões de reais, usado como argumento positivo pelos que o defendem que assusta os que são contrários. Na cabeça destes últimos, está a certeza de que se o improvável acontecer e se algo sair errado, certamente a solução não será remover o Estaleiro após sua instalação e desprezar o investimento já executado. O chamado Plano B certamente não será esse.

Dessa forma entendo que o único Plano B, viável seria, ao invés de excluir ou desprezar os atores contrários ao projeto, urge reuni-los todos na busca por um local em Santa Catarina, onde o Estaleiro possa ser instalado sem que esta espada sobre as incertezas do futuro, seja colocada sobre nossas cabeças. Precisamos rever urgentemente a metodologia e os critérios técnicos, econômicos, ambientais e sociais que foram adotados na escolha daquele polêmico local.

Desejamos que o Estaleiro permaneça em Santa Catarina, reconhecemos no Sr. Eike Batista um empresário correto e competente e o esforço da OSX em transformar o processo de licenciamento no mais transparente possível. Porem antes de concordarmos com sua instalação em Biguaçu, precisamos ter a certeza de que não existe local melhor, porque, fazendo uma analogia, se o Estaleiro fosse implantando no Rio de Janeiro, certamente os cariocas não concordariam que fosse localizado na zona sul da Cidade e tão próximo de Copacabana, de Ipanema, do Leblon ou da Barra da Tijuca.

*Atila Rocha dos Santos é Secretário de Habitação e Saneamento Ambiental e Superintendente do IPUF (Prefeitura Municipal de Florianópolis).

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Furando o bloqueio

Imbituba, SC, Brasil, domingo, 1° de agosto de 2010.


Missa Campal marca
resistência
contra a
derrubada de engenho

comunitário em Imbituba



Por Rui Fernando da Silva Neto (texto)
e Pepe Pereira dos Santos (fotos)

Ameaçados de serem despejados de 250 hectares e verem destruídos o engenho comunitário e as plantações de mandioca, os agricultores organizados na Associação Comunitária Rural de Imbituba (ACORDI) realizaram uma missa campal na sede da associação, na noite deste domingo. A celebração contou com a participação de apoiadores amigos, moradores da comunidade Portelinha, movimentos sociais, sindicatos e estudantes da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) ligados às lutas populares. No evento, os padres José Eduardo Bittencourt e Ademir, em nome da Igreja Católica, se comprometeram a interceder pelos agricultores no conflito e as preces pediram forças para a luta pela terra.

O despejo começou a ser realizado durante a semana. As casas que ficavam na extrema do terreno foram derrubadas. Restam ainda a sede da associação, o engenho e as plantações. Nesta área os agricultores temem a chegada do oficial de justiça com capangas, tratores e as forças repressoras do Estado. O despejo da área em que está o engenho pode ser feito na manhã desta segunda-feira, 2 de agosto de 2010, mas os inimigos da população já indicaram que esperarão a desmobilização para agirem.

A vigília permanece! Os agricultores contam com a solidariedade de amigos, movimentos sociais e o apoio incondicional dos moradores da comunidade Portelinha, de Imbituba, ameaçados de despejo de suas casas. A rede de juristas populares também mobiliza as forças jurídicas que podem reconhecer a área como de direito das Comunidades Tradicionais. Mas até agora a justiça se posicionou sempre favorável ao despejo e somente a luta garante os agricultores na terra.

Após a cerimônia, uma comissão formada por advogados e representantes da ACORDI reuniu-se com prefeito e polícia militar.


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Segue a
luta pelo
Bar do Chico


Por Elaine Tavares*

Novo ato político acontece

no domingo, dia 8 de agosto


Era a metade dos anos 80, a democracia brasileira andava com pernas bambas, a vida saía da escuridão, mas as coisas ainda estavam muito confusas. A luta popular conseguia se fazer às claras, mas persistia o medo, assim como o preconceito. Para quem atuava no movimento de esquerda em Florianópolis havia um lugar onde era possível se encontrar e sentir-se em casa. Era um pequeno barraco de madeira na praia do Campeche, que havia deixado de ser uma cabana de pesca para virar um bar. Ali, nas tardes de domingo, o povo se reunia para conversar, discutir política ou apenas tomar sol. Nas noites de inverno, ao redor da fogueira, o povo também se juntava para dançar e celebrar a vida.

Para quem era da comunidade, o lugar igualmente passou a ser uma espécie de porto seguro. Não havia nada na praia e a cabana de madeira passou a ser uma referência. Como o seu Chico, que cuidava do lugar, era pessoa conhecida no Campeche, de família tradicional, o bar foi virando espaço comunitário também. Ali eram celebrados os aniversários, as festas do bairro, por ali passava a Dona Nicota, a bandeira do divino, a folia de reis, e ali terminava a alegria do carnaval. Localizado ao lado da capela, no coração histórico do Campeche, o Bar do Chico rapidamente se entranhou no cotidiano. Não era só um bar, era lugar do povo campechiano e de boa parte dos militantes populares da cidade. Território liberado para a festa e para a política. Não foram poucas as lutas e ações populares que nasceram das conversas ali naquele trecho de areia.

No início dos anos 90 um filho do Campeche se elegeu vereador. Lázaro Daniel. Não por acaso, filho do seu Chico, o dono do bar tombado agora em 2010. E este foi um vereador que muito incomodou ao poder. Na época, a cidade fervilhava na luta pela moradia e eram constantes as ocupações de área urbana e as mobilizações populares. Lázaro estava metido nesta briga até o pescoço. Sua voz na Câmara de Vereadores estava a serviço do povo em luta e ninguém conseguiu dobrá-lo. Foi aí que começou a perseguição ao Bar do Chico. Aquele era um lugar que subvertia a ordem, que acolhia os “malditos”, que servia de espaço para a organização comunitária. E, não bastasse isso, era do pai do Lázaro. O poder encontrava um ponto por onde atacar o vereador.

Desde aí, a batalha foi grande. Longos anos de discussão na justiça e neste meio tempo, a comunidade foi consolidando o espaço como o seu lugar. O Bar do Chico virou patrimônio cultural, assim como o espectro de Saint Exupéry ou a capela São Sebastião. Já não era só um bar, era parte da alma campechiana. Tanto que a comunidade entrou com um processo de tombamento para o bar. Daí soar muito estranho o argumento do juiz Hélio do Valle Pereira ao dizer que o povo do Campeche não tinha se importado com o processo. Ora, pedir o tombamento como patrimônio histórico imaterial não é se importar?

Nos últimos anos o Campeche tem sido a ponta de lança na luta por um Plano Diretor que não seja predador, que respeite o ambiente, que se faça em harmonia com os recursos naturais. E o Campeche foi além, organizou seu povo e construiu seu próprio plano, o qual apresentou ao poder público. Os governantes se fizeram surdos, inventaram outros planos e o Campeche lutou. Agora, na era Dário, aconteceu o Plano Diretor Participativo e o Campeche de novo se organizou, melhorou seu plano e tem lutado para fazer valer sua palavra. É um bairro que tem tradição de luta, que mantém movimentos articulados e atuantes, que incomoda demais o poder. Por isso era preciso quebrar a espinha desta gente. Nada melhor então do que atacar um velho de mais de 80 anos, que teve a ousadia de colocar no mundo alguém como Lázaro e ainda criar um espaço onde o povo pode se organizar e conspirar.

É por isso que as pessoas que vivem no Campeche e que militam nos movimentos da cidade estão irmanadas na luta pela reconstrução do Bar do Chico. A pequena cabana de madeira foi derrubada numa manhã fria de julho, sem aviso, sem nada. Vieram os homens da Comcap, arrombaram a porta, tiraram as coisas de dentro e destruíram o lugar. Estraçalharam parte da cultura do bairro, pisaram na memória, destroçaram o patrimônio das gentes.

Mas esse crime cultural não ficará sem resposta. Uma delas já foi dada. Num ato público realizado sábado, dia 24 de julho, o velho bar ressurgiu numa obra de arte produzida pelo artesão Paulo Renato Venuto. Um gesto poético, simbólico, que serviu para impulsionar outras ações e idéias. A comunidade quer de volta o mesmo bar, concreto, real. Por isso, no último dia 31 o grupo de mobilização pela reconstrução do Bar do Chico esteve reunido, planejando ações para que o velho espaço comunitário possa ressurgir dos escombros.

Duas frentes de luta foram abertas. Uma delas será na justiça. Como estava em andamento o processo pelo tombamento do lugar, a Associação dos Moradores do Campeche vai dar seguimento ao pleito, exigindo, portanto, a reconstrução. A outra é política e de ação direta do povo. Uma nova manifestação está sendo organizada para o domingo, dia 8 de agosto, às 10h, com partida dos escombros do Bar do Chico. A comunidade mobilizada fará uma caminhada, pela praia, até um empreendimento imobiliário (Essence Life Residence) que está sendo erguido nas dunas do Campeche. Vão protestar contra essa invasão e exigir da justiça o mesmo tratamento que deu ao casebre de madeira que era o Bar do Chico.

O povo do Campeche discutiu e decidiu que se a cidade de Florianópolis é conhecida pela alcunha do “já teve”, por conta de já ter deixado sumir coisas importantes e históricas, como o Miramar, o Expresso, o Grupo Sul, o mesmo não vai se dar ali no bairro. As gentes não aceitam conviver com a idéia de que o bar do Chico não existirá mais. E vão reconstruir. Se quem mandou derrubar o bar achou que iria quebrar a espinha do Campeche, se enganou. Aqui vive uma gente-peixe, mágica, feita de areia, mar e sol. Uma espinha se quebra, outra vem, mais forte, mais viva...

*Elaine Tavares é jornalista. Blog da Elaine.

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O bom cinema italiano


Vítimas da Tormenta (Sciuscià), obra do diretor italiano Vittorio De Sica, abre o Ciclo de Agosto do Cineclube Italiano da Fundação Cultural Badesc, realizado em parceria com o Centro di Cultura Italiana. Filmado em 1946, com 93 minutos de duração, Vítimas da Tormenta tem no elenco os atores Franco Interlenghi, Rinaldo Smordoni e Annielo Mele. Dois garotos pobres vivem de engraxar sapatos, cultivando o sonho de comprar um cavalo branco. Após cometer um furto, acabam presos num reformatório. É o começo de muitos problemas. O que filme levou o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro será exibido às 19 horas desta terça-feira (3.8), no auditório da Fundação, no Centro de Florianópolis.

Os demais longas do Ciclo são os seguintes: Ladrões de Bicicletas (Ladri di Biciclette), 10.8; Milagre em Milão (Miracolo a Milano), dia 17.8; Matrimonio à italiana (Matrimonio all’italiana), dia 24.8 e, Os Girassóis da Rússia (I Girasoli), 31.8. Mais informações. Acompanhe o site, o blog e o twitter (@FCBadesc) da Fundação Cultural Badesc.


Vítimas da tormenta

Um comentário:

Unknown disse...

Com prazer li que Atila Rocha dos Santos, o Secretario Municipal do IPUF, está preocupado sobre o local do Estaleiro OSX. A situação mostra que Grande Florianópolis precisa urgentamente um Poder Metropolitana porque IPUF nem a Prefeitura de Florianópolis tem algum poder em
Biguaçu.

Ben Kraijnbrink