23.5.10



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O drama da Armação

(Textos e ensaio fotográfico)

Por Celso Martins


Soldados do Exército e moradores tentam conter o avanço do mar com pedras, entulhos, barro e sacos de areia. Os militares estão concentrados nos trechos em que as ondas podem alcançar o leito do rio Sangradouro e ampliar a inundação das casas. Esse rio nasce do excesso de água da lagoa do Peri, localizada a cerca de três metros acima do nível do mar e que, aparentemente, não corre risco.

Os moradores estão comprando pedras e barro e depositando os materiais na frente de seus terrenos. Outros encaixotam pertences e transportam móveis a locais seguros. Os mais desanimados estão se mudando. Além de perder as casas, diversos moradores acompanham atônitos e impotentes o desaparecimento de seus terrenos.

"O mar comeu 10 metros de praia em 24 horas", assegura uma moradora. "Fui dormir às 4 da manhã", preocupada com as ondas que se tornaram mais agressivas com a ressaca marinha. Um vizinho acha exagerada a avaliação. "No máximo cinco metros", calcula. Nos dois casos o drama não diminui, acontece de forma mais lenta ou rápida. O site ClicRBS fala em 1.800 pessoas atingidas.

No último sábado foi possível observar o burburinho por volta do meio dia, quando a maré começava a subir. Os pescadores levaram suas embarcações para as praias do Pântano do Sul e Barra da Lagoa. Muitos estão sem pescar há semanas. "Não tem mais faixa de areia", justifica um. Eles não aceitam a explicação de que o molhe entre as praias da Armação e a foz do rio Sangradouro seja responsável pelo avanço da erosão marinha. "Isso ali existe desde os tempos da caça da baleia", assinala outro pescador. Os dois falam nas imediações de antigas estruturas usadas na caça e beneficiamento das baleias, no século 19, cujos vestígios resistiram a muitas ressacas.

Apesar de toda essa tensão, não se nota a presença de representantes da Prefeitura. A dimensão do problema é superior à capacidade de ação da secretaria municipal de Obras. É preciso um envolvimento maior do Executivo municipal. Assistentes sociais, por exemplo, agentes de saúde, professores e outros funcionários deveriam estar apoiando diretamente os moradores, com assistência material e espiritual. A Guarda Municipal também poderia ser empregada. No sábado um soldado do Exército fazia o controle do trânsito na área em que estão sendo colocados os sacos de areia. A Câmara Municipal precisa se manifestar e estar mais presente. Os governos Estadual e Federal precisam ser mobilizados.

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LOCALIZAÇÃO







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Tragédia prevista
Mar avançou 50 metros em meio século

O que acontece na praia da Armação não é novidade para os estudiosos, conforme levantamento de Norberto Horn Filho. (1)

Entre outros estudos se destaca o de Janete Abreu de Castilhos, apresentado em abril de 1997. Comparando fotografias aéreas da praia da Armação entre 1938-1994 e realizando pesquisas de campo durante 14 meses, ela chegou a uma constatação surpreendente: ao longo de 58 anos a taxa de erosão foi de 85 centímetros por ano - sobretudo no setor sul da praia, onde as famílias perdem suas casas e terrenos. E foi exatamente esse avanço da urbanização que provocou o desaparecimento das dunas frontais, deixando a área sem a proteção natural. (2)

Outra pesquisa acadêmica importante foi desenvolvida por Alexandre M. Mazzer e Sérgio Dillenburg - Variações temporais da linha de costa em praias arenosas dominadas por ondas do sudeste da Ilha de Santa Catarina (Florianópolis, SC, Brasil). (3)

Com Célia R. de Gouveia Souza, Mazzer e Dillenburg também publicaram uma advertência com o título Proposta de método para análise de vulnerabilidade à erosão costeira no sudeste da ilha de Santa Catarina. (4)

Estudos de Janete Josina de Abreu, com co-autoria de João Carlos Rocha Gré e Norberto Olmiro Horn Filho, apresentado na Sepex de 2008 da UFSC, confirmaram a "ocorrência de importantes processos erosivos na área de estudo [setor sul, Armação] na segunda metade do século 20", baseados em aerofotogrametrias de 1938 a 1994. "Entre as causas levantadas para explicar os processos erosivos diagnosticados estão: o balanço sedimentar costeiro longitudinal, o impacto de interferências antrópicas [humana] sobre a orla, a ocorrência de eventos erosivos de intensidade excepcional e a elevação contemporânea do nível do mar". (5)


FONTES

1) O professor Norberto Horn Filho dá uma visão geral dos estudos sobre morfologia de praia na Ilha de Santa Catarina entre 1970 e 2004. PDF.

2) Morphodynamic and study of the "Armação" beach, Santa Catarina Island, Brazil. Janete Abreu de Castilhos / UFSC - Departamento de Geologia e Oceanologia - Universidade de Bordeaux - França. In Aquitaine Ocean. Gestion de la zone littorale de l'ilhe de Santa Catarina (Bresil) - Manejo Costeiro da IIha de Santa Catarina (Brasil). Atas do colóquio franco-brasileiro. Florianópolis-SC, 2-5 abril de 1997. (Exemplar nº 3 - 1997). Tradução: Ben Kraijnbrink.

3) Variações temporais da linha de costa em praias arenosas dominadas por ondas do sudeste da Ilha de Santa Catarina (Florianópolis, SC, Brasil) Alexandre M. MAZZER(a,b) & Sérgio DILLENBURG (b). Pesquisas em Geociências, 36 (1): 117-135, jan./abr. 2009 ISSN 1518-2398 Instituto de Geociências, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS, Brasil E-ISSN 1807-9806. (a - Departamento de Geografia, Universidade da Região de Joinville-UNIVILLE. Campus Universitário s/n, Bom Retiro. Joinville- SC. E-mail: alexandre.mazzer@univille.edu.br; mazzer@matrix.com.br. b - Centro de Estudos de Geologia Costeira e Oceânica-CECO, Universidade Federal do Rio Grande do Sul-UFRGS. Av. Bento Gonçalves, 9500, Prédio 43.125 - Porto Alegre-RS. E-mail: sergio.dillenburg@ufrgs.br. Recebido em 09/2007. Aceito para publicação em 04/2009). Versão online publicada em 19/11/2009 (www.pesquisasemgeociencias.ufrgs.br). PDF.

4) Proposta de método para análise de vulnerabilidade à erosão costeira no sudeste da ilha de Santa Catarina, Brasil. Alexandre M. MazzerI; Sergio R. Dillenburg; Célia R. de Gouveia Souza. Rev. bras. geociênc. v.38 n.2 São Paulo jun. 2008. PDF.

5) Anais da 7ª Semana de Ensino, Pesquisa e Extensão Sepex-UFSC. De 22 a 25 de outubro de 2008. EROSÃO COSTEIRA E OSCILAÇÕES DO NÍVEL MÉDIO DO MAR: UM ESTUDO DE CASO NA PRAIA DA ARMAÇÃO, ILHA DE SANTA CATARINA, BRASIL. Janete Josina de Abreu, com co-autoria de João Carlos Rocha Gré, Norberto Olmiro Horn Filho.

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FOTOS (22.5.2010)


Centro histórico da Armação







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Ação do Exército















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Foz do Sangradouro (molhes)





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Rio Sangradouro





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Retratos da destruição



















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A ação das ondas





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5 comentários:

Anônimo disse...

Com a intensão de ajudar a população a encontrar uma solução para o grave problema da erosão na pria da armação, recomendo entrar no YOUTUBE, digite Bagwall e assista o video sobre essa nova tecnologia que tem obtido êxito no controle da erosão costeira no Brasil.

Fernando Evangelista disse...

Alô, Celso,

Mestre é mestre - tanto no texto quanto nas fotos. Parabéns pelo teu trabalho.

E a prefeitura, por onde andará?

Unknown disse...

Excelente reportagem! E é muito bom ver destacado meritoriamente o trabalho de um excelente profissional como Alexandre Mazzer...

Leonardo Leal disse...

Bom trabalho muito bom mesmo!! vou repassar esse link pra todo mundo! Saudações da galera do Lab.Sedimentologia UFSC.

Marcos de Castro Júnior disse...

Excelente trabalho Amigo.

Estou realizando 1 trabalho do colégio (IEE) com essas fotos.

Grande Abraço.