27.7.11

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cr
Amílcar Neves, Emanuel Medeiros Vieira, Olsen Jr., Olsen Jr., Amilcar Neves, Emanuel Medeiros Vieira, Emanuel Medeiros Vieira, Olsen Jr., Amílcar Neves Amílcar Neves, Emanuel Medeiros Vieira, Olsen Jr., Olsen Jr., Amilcar Neves, Emanuel Medeiros Vieira, Emanuel Medeiros Vieira, Olsen Jr., Amílcar Neves


Cruz lateral da igreja de Nossa Senhora das Necessidades e
Santo Antônio. Santo Antônio de Lisboa. Foto: Celso Martins


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Santa Maria Magdalena, Serv

Por Amílcar Neves*

O assinante de jornais Joaquim Maria dos Reis Alves mora nas cercanias da Universidade Federal, em um bairro que pode ser a Trindade, o Pantanal, o Cór'go Grande, a Carvoeira ou a Serrinha. Sabe-se, no entanto, que sua casa fica na Servidão Santa Maria Magdalena do Cordeiro Santíssimo de Deus, Serva Humilíssima de Jesus. O nome é muito grande para as placas de rua, tanto quanto o foi na época em que as pessoas mandavam cartas pelo Correio: nunca houve envelope que suportasse tal tamanho, que abrigasse tamanho comprimento de nome.

Necessitou-se, assim, abreviar o nome da ilustre homenageada, o que desencadeou uma furiosa polêmica entre a vizinhança, circunstância que acarretou inimizades perpétuas e leais: Magdalena Cordeiro de Jesus, por exemplo, foi denominação execrada por Omero Luíz Anjos Santo, decano dos professores de Português das primeiras séries colegiais e morador do local: "Há de ser, então, Madalena Ovelha, em respeito ao idioma pátrio!", respeito que ele não perdoa ao pai ter faltado quando foi registrá-lo em cartório.
O único assunto que sempre foi unanimidade entre os moradores a partir do sexto mês da sua inauguração é a permanência da casa de swing no final da ruela, já na subida do morro, fazendo fundos com uma reserva silvícola permanente tal como instituído pelos edis da Capital em sessão marcada por grande euforia tanto do povo quanto dos seus representantes - esta talvez até maior do que aquela, o que causou profunda espécie.

A explicação para o fenômeno chegou tempos depois, quando confirmou-se o que todos ali já sabiam: às vezes na sexta-feira noite alta, às vezes no sábado, quando o jornal do dia seguinte já está na rua, reúnem-se ali, naquela casa no fim do caminho, políticos municipais, estaduais e até federais para decidirem, nas salas mais ou menos reservadas ou nos salões de atividades grupais, sobre os assuntos de maior interesse da população. Com a reserva florestal aos fundos da casa, preserva-se de vizinhos inconvenientes o sigilo das altas deliberações republicanas ali tomadas e que somente começarão a ser divulgadas na segunda-feira, quando já serão assunto antigo e superado na pauta da avidez por escândalos de parte do respeitável público.

Dona Therezinha Cardozo Gonçalvez, conhecida nas redondezas como Dona Zezezé, é uma entusiasta da casa no fim da servidão: "Uma bênção, criatura! Segurança total aqui. Qualquer cristão pode deixar a porta da casa aberta com dinheiro vivo solto em cima da mesa que ninguém ousa bulir nele! Pois hão de querer qualquer confusão ou contratempo tanto os donos do parque de diversões quanto os seus ilustres fregueses?" Feito porta-voz, ela fala o que toda a vizinhança pensa e sente.

O que muito incomoda o assinante Joaquim Maria dos Reis Alves tem a ver justamente com isso. Aos sábados, ao retornar da sua caminhada diária com a bicicleta (uma ofensa sofrida pelo nervo da perna direita impede-o de pedalar, mas não de andar), ele passa com as rodas do veículo por cima do jornal de domingo caso ninguém o tenha recolhido e só aceita lê-lo, como faz toda manhã, ao alvorecer do dia seguinte. E então reclama que as notícias da véspera, as deliberações da honorável casa ali adiante e que todo o mundo já conhece de ouvir falar (ou de ter presenciado), não são confirmadas pela edição dominical da folha local.

À tarde, cada domingo, ele senta e, em letras cultivadas por aulas de caligrafia, escreve sua carta de protesto para o jornal.

*Amilcar Neves é escritor com oito livros de ficção publicados. A partir de 1.7.2011, é candidato à Cadeira nº 32 da Academia Catarinense de Letras. Crônica publicada na edição de hoje (27.7) do jornal Diário Catarinense (Florianópolis-SC). Reprodução autorizada pelo autor.

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O ano de 1918 em Petrogrado. 1920.
Por Petróv-Vodkin (1878-1939).
Editorial de Artes Aurora. Leningrado (URSS), 1985.
Reproduções: Celso Martins

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A CIGARRA E A FORMIGA,

R E V I S I T A D A S

Por Olsen Jr.

Depois que se aprendeu a administrar impulsos, controlar emoções, absorver indelicadezas sem revidar, ser paciente com o aprendizado dos outros, tolerante com as deficiências ao redor e com as próprias, em suma, aceitar os seres vivos como eles foram feitos e como se formaram... Então começamos a tirar o melhor que a vida oferece porque isso é sabedoria, a súmula de uma existência.

Penso nisso enquanto ouço várias estultices vindas da mesa próxima. Percebo tudo como parte da vida... Por que “eles” deveriam estar conversando sobre o que eu gostaria de ouvir? E quem sugere que este meu silêncio também não pode estar causando constrangimento na mesa em que estão?

Estava me sentindo como a cigarra, duvidando da própria arte... Na fábula “A cigarra e a formiga”, em sua versão clássica.

Durante o ano, enquanto a formiga trabalhava, a cigarra cantava. Quando chegou o inverno, a cigarra foi pedir auxílio para a formiga. Esta indagou “o que você fez o tempo todo?”... “Eu cantei” responde a cigarra... “Então - responde a formiga – Pois agora, dance!”...

Aquela era a concepção obtusa do que deve ser o trabalho. A arte que não possui um sentido prático imediato nunca é considerada na visão mundana e faz o artista duvidar do “seu fazer” ou de que alguém prescinda de sua arte.

Mas o escritor Monteiro Lobato criou uma versão moderna para a mesma fábula.

Enquanto passavam a primavera, verão e outono a cigarra cantava e a formiga trabalhava como sempre. Quando chegou a estação do frio e do recolhimento, a cigarra foi pedir ajuda para a formiga. Esta indagou “o que você fez durante o ano?” e a formiga respondeu “Eu cantei o tempo todo”... E a formiga mostrando reconhecimento diz “então era você que nos alegrava durante o trabalho, que amenizava com o seu canto a dureza do dia-a-dia... Olha só, não acredito, tens toda a nossa admiração e carinho, pode entrar que vamos abrigá-la”...

Na condição de escritor nestes “Tristes Trópicos”, como diria Claude Lévi-Strauss, tinha passado boa parte da vida abraçando causas coletivas, os interesses sociais sempre em detrimento do universo particular do indivíduo, o bem estar do grupo e não de uma unidade de sua composição...

Os verões, as primaveras, os outonos e agora chega à vez dos invernos... E é este Ser que avança pelas ruas desertas das cidades vazias buscando um laivo de reconhecimento, de uma voz que o conforte, mesmo vinda das profundas entranhas do anonimato, basta apenas que num sussurro breve, mas honesto, diga com clareza: seja bem vindo em nosso meio, meu caro, porque você é um escritor, e um escritor sempre fará com que este nosso mundo seja melhor!

*

A Operária. 1925. Kuzma Petróv-Vodkin (1878-1939).
Editorial de Artes Aurora. Leningrado (URSS), 1985.

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NOVAS CARTAS BAIANAS

FERROVIA TEM CONSTRUÇÃO
EMBARGADA PELO IBAMA


Por Emanuel Medeiros Vieira


“Corrompemos o ar,/devastamos as matas,/envenenamos a corrente dos rios./E agora o que

Esperamos?/Nos campos brumosos, o silvo da perdiz/é um duro lamento repetido./A lebre,
diante do cano da escopeta,/Somente pôde olhar com piedade o caçador.” (César Cantoni)


A principal obra do PAC na Bahia, com investimento previsto de R$4,2 bilhões, a Ferrovia de Integração Oeste Leste (Fiol) teve sua construção embargada pelo Ibama.

Como lembra a jornalista Patrícia França, a justificativa do órgão é de que a Valec Engenharia, a estatal do Ministério dos Transportes, responsável pela execução do projeto, não cumpriu as condicionantes ambientais de instalação da obra.

A estatal Valec é uma das investigadas no esquema de corrupção do PR (Partido da República) no ministério dos Transportes.

(O sentido das palavras foi completamente corrompido.

Esse partido (?) fisiológico, afetado por tantas denúncias de corrupção – quem sabe, uma ratoeira para lesar o contribuinte brasileiro –, tem o nome de Partido da República...

Nada mais anti-republicano que ele...)

O presidente da Valec, José Francisco das Neves, foi demitido no início do mês.

O embargo do Ibama atinge os quatro primeiros lotes da ferrovia, localizados entre Caetité e Ilhéus, num total de 537quilômetros.

Teoricamente, o referido trecho beneficiaria a indústria de extração de minério de Caetité.

O segundo trecho, ligando Caetité a Barreiras, somando 485 Km, permitiria o escoamento da produção agrícola do Oeste baiano.

O terceiro, ligaria Barreiras a Figueirópolis (em Tocantins), onde ocorreria a integração dom a ferrovia Norte-Sul.

O Ibama listou 20 condicionantes ambientais específicos.

Entre eles, o levantamento das áreas rurais potencialmente interferidas pela ferrovia, intervenção em cursos d’água, impacto sobre a fauna e invertebrados, utilização de dormentes apenas de madeira oriundas de reflorestamento, projetos de reassentamento e indenizações à indígenas e quilombolas.

(Salvador, julho de 2011)

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Mulheres nos arredores de Moscou. Konstantin Iuon (1875-1958).
Editorial de Artes Aurora. Leningrado (URSS), 1985.


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C L E P T O C R A C I A

Por Emanuel Medeiros Vieira

“Dnit pagou, Pagot

Dnit fraudou, fraudou.

Lá dentro do esquema

Todo mundo se arrumou

MT, MT, MT

Por que todo mundo olha tanto pra você?”

(É a marchinha do Dnit – espécie de paródia com a crise no Ministério dos Transportes)

Segundo Caldas Aulete, cleptomania é a tendência irresistível para o roubo.

Mas no Brasil, a doença maior é a da impunidade.

Governabilidade não é licenciosidade.

Mensalões, operações policiais, corruptos e corruptores, fichas-sujas, leniência, apodrecimentos completo dos valores republicanos.

Não é moralismo: mas em 66 anos de vida, talvez nunca tenha visto essa complacência com o mal e com a impunidade.

Essa apropriação do público pelo privado já havia sido detectada – com densidade e brilhantismo – por Raymundo Faoro na sua obra “Os Donos do Poder”.

Mas estamos chegando a níveis impressionantes e inimagináveis

Tal impunidade, gera nas pessoas de bem um sentimento de nojo e de impotência.

Por isso o correspondente do jornal “El País” no Brasil, ficou estarrecido com a ausência de mobilização da nossa gente contra a corrupção.

Não éramos assim.

Estamos nos transformando numa gente desfibrada?

NOVAS CARTAS BAIANAS: CONSTRUTORA DEMITE 5 MIL TRABALHADORES

A empresa baiana de construção civil R. Carvalho, demitiu essa semana 5 mil trabalhadores – 4,2 mil só na cidade de Feira de Santana.

Enquanto isso, o gerente da Caixa Econômica Federal, Gilberto Reis, se recusou a falar com os jornalistas. E deveria fazê-lo.

Entre as obras paradas, está a construção de moradias pelo programa federal “Minha Casa, Minha Vida”.

(Salvador, julho de 2011)

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A Mãe. 1932. Por Alexandr Deineka (1899-1969).
Editorial de Artes Aurora. Leningrado (URSS), 1985.

25.7.11

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NOSSO VIKING
JÁ É IMORTAL

Olsen Jr. na cadeira 11 da ACL

Olsen no verão de 2010. Foto: Celso Martins

O escritor Oldemar Olsen Júnior acaba de ser eleito para ocupar a cadeira nº 11 da Academia Catarinense de Letras (ACL). A escolha aconteceu na noite desta segunda-feira (25.7). "Não foi fácil, mas deu tudo certo", comentou Olsen por telefone depois de confirmado seu ingresso como imortal. Olsen Jr. nasceu em Chapecó e, por muitos anos, residiu em Blumenau, atuando como jornalista. Tem 56 anos de idade e colabora com o Sambaqui na Rede desde o surgimento em 2007. Mais recentemente passou colaborar com o Portal de Notícias Daqui na Rede. Saiba mais no ClicRBS.

A cadeira nº 11 tem como patrono Francisco Carlos da Luz (Florianópolis, 29.10.1830 - Rio de Janeiro, 22.6.1906), doutor em Fisica e Matemática, marechal do Exército, participou da Guerra do Paraguai. O primeiro ocupante desta cadeira foi seu neto Edmundo da Luz Pinto (Rio de Janeiro, 4.1.1898 - 1963), bacharel em Direito, parlamentar e diplomata. Foi substituído por Henrique Stodieck e, mais recentemente, por Hoyêdo de Gouvêa Lins. Olsen Jr. é o quarto ocupante. A entidade se origina na Sociedade Catarinense de Letras criada em outubro de 1920 e transformada em ACL a partir de janeiro de 1924.
Mais detalhes no site da ACL.

24.7.11

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Sessão Olsen Jr.

A cigarra e
a formiga,
revisitadas

*
Nosso viking
na Academia


Gravura: François Chauveau (1613 – 1676)

*


NOSSO VIKING
NA ACADEMIA



Por Celso Martins

Dois frequentadores assíduos do Sambaqui na Rede pleiteiam vagas na Academia Catarinense de Letras (ACL): Amílcar Neves, cujas crônicas semanais são aqui reproduzidas, e que já se apresentou como candidato; e Olsen Jr., candidato a uma cadeira na ACL pela sexta vez, cuja "Carta aos Acadêmicos" reproduzimos aqui.

Apoiando integralmente o pleito de Amílcar Neves, chamo a atenção para o caso de Olsen Jr., preterido por periclitantes prados ocultos e quejandos sob argumentos pueris e obtusos, nunca claros, sempre obscuros.

É importante destacar que interessa o que está expresso no artigo 8º do Estatuto da ACL: "Poderá postular Cadeira de Membro Efetivo ou Perpétuo da Academia Catarinense de Letras qualquer pessoa de nacionalidade brasileira, de expressão no meio cultural do Estado, com livros publicados, que tenha tradição com a terra catarinense e comprove conhecida cultura literária". Tudo o que estiver fora dos parâmetros alinhados no artigo é picuinha, inveja, rancor e mágoa, sentimentos próprios dos arrenegados com a vida, a exaltação do viver, o olhar crítico e aguçado, a criatividade.

Formar grupinhos é difundir fidalguias de um dimanar anfibológico, eivados de importunidades, tão quanto ser o mecenas de uma Jônia imaginária. Devemos lembrar que no caldeirão elástico agregado sob o estro e iniciativa de José Boiteux e jovens intelectuais e literatos coevos, a ACL emergiu como instituição influente em diferentes momentos de sua trajetória desde 1922 quando soube representar a sombra e o fulgor, o odorífero e o inodoro.

Ou seja, a diversidade da produção cultural, o amplo leque das possibilidades, os diferentes olhares sobre um mesmo objeto, momento, personagem. Uma Academia de Letras onde só entram protegidos tende a se depauperar, a perder a gusa, a fibra, a capacidade de atração, o incitar permanente, o incitamento como preceito e o estímulo imperativo.

Tive o cuidado de olhar quem ocupa as cadeiras da ACL e verificar que, a maioria esmagadora, merece estar agatanhando a laca dos assentos com seus conjugados de glúteos.

Se Olsen Jr. não chegar agora, chegará noutra ocasião. O que não podem fazer é delongar um reconhecimento já existente da parte do público leitor. Tanto aqui no Sambaqui na Rede, quanto no Portal de Notícias Daqui na Rede, os escritos de Olsen são lidos, relidos e comentados. Assim como os de Emanuel Medeiros Vieira (mas aí já é outra história).

*


A CIGARRA E
A FORMIGA,
REVISITADAS


Por Olsen Jr.

Depois que se aprendeu a administrar impulsos, controlar emoções, absorver indelicadezas sem revidar, ser paciente com o aprendizado dos outros, tolerante com as deficiências ao redor e com as próprias, em suma, aceitar os seres vivos como eles foram feitos e como se formaram... Então começamos a tirar o melhor que a vida oferece porque isso é sabedoria, a súmula de uma existência.

Penso nisso enquanto ouço várias estultices vindas da mesa próxima. Percebo tudo como parte da vida... Por que “eles” deveriam estar conversando sobre o que eu gostaria de ouvir? E quem sugere que este meu silêncio também não pode estar causando constrangimento na mesa em que estão?

Estava me sentindo como a cigarra, duvidando da própria arte... Na fábula “A cigarra e a formiga”, em sua versão clássica.

Durante o ano, enquanto a formiga trabalhava, a cigarra cantava. Quando chegou o inverno, a cigarra foi pedir auxílio para a formiga. Esta indagou “o que você fez o tempo todo?”... “Eu cantei” responde a cigarra... “Então - responde a formiga – Pois agora, dance!”...

Aquela era a concepção obtusa do que deve ser o trabalho. A arte que não possui um sentido prático imediato nunca é considerada na visão mundana e faz o artista duvidar do “seu fazer” ou de que alguém prescinda de sua arte.

Mas o escritor Monteiro Lobato criou uma versão moderna para a mesma fábula.

Enquanto passavam a primavera, verão e outono a cigarra cantava e a formiga trabalhava como sempre. Quando chegou a estação do frio e do recolhimento, a cigarra foi pedir ajuda para a formiga. Esta indagou “o que você fez durante o ano?” e a formiga respondeu “Eu cantei o tempo todo”... E a formiga mostrando reconhecimento diz “então era você que nos alegrava durante o trabalho, que amenizava com o seu canto a dureza do dia-a-dia... Olha só, não acredito, tens toda a nossa admiração e carinho, pode entrar que vamos abrigá-la”...

Na condição de escritor nestes “Tristes Trópicos”, como diria Claude Lévi-Strauss, tinha passado boa parte da vida abraçando causas coletivas, os interesses sociais sempre em detrimento do universo particular do indivíduo, o bem estar do grupo e não de uma unidade de sua composição...

Os verões, as primaveras, os outonos e agora chega à vez dos invernos... E é este Ser que avança pelas ruas desertas das cidades vazias buscando um laivo de reconhecimento, de uma voz que o conforte, mesmo vinda das profundas entranhas do anonimato, basta apenas que num sussurro breve, mas honesto, diga com clareza: seja bem vindo em nosso meio, meu caro, porque você é um escritor, e um escritor sempre fará com que este nosso mundo seja melhor!





22.7.11

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Engenhos do distrito abrem
as portas no final de semana
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OUTONO, poema de
Emanuel Medeiros Vieira


Três dos cinco engenhos do distrito de Santo Antônio de Lisboa vão estar em atividade neste final de semana, produzindo farinha de mandioca e alguns derivados como o biju. Todos os engenhos vão funcionar no sábado (23.7), mas o ponto alto será no domingo (24.7), durante todo o dia.
É a oportunidade para se conhecer ou matar as saudades do processo de produção da farinha, desde a colheita e transporte da mandioca até o engenho, onde será cevada (ralada), obtendo-se uma massa branca. Essa massa é submetida a pressão para retirar o excesso de umidade, ficando pronta para ser forneada e transformada em farinha ou usada como matéria-prima da cacuanga, biju e rosca.
A iniciativa integra o Circuito Cultural do Distrito de Santo Antônio de Lisboa “De Coração Aberto” promovido pelas entidades comunitárias da região com o apoio da Prefeitura Municipal.
Vão abrir as portas para produção e visitação os engenhos de Cláudio Andrade, na Praia Comprida/Caminho dos Açores, com a participação de Beto Andrade, e os de Djalma Dias (Barreira, Santo Antônio) e Amauri dos Santos (Barra do Sambaqui). (O desenho acima é de Jandira Lorenz).

Encontro
No domingo (24.7), às 10 horas, acontece o 1º Encontro de Engenhos da Região de Florianópolis, reunindo produtores tradicionais em atividade e coordenadores de engenhos com nova configuração (cultural). Após o encontro os participantes do encontro sairão em visita aos demais engenhos em funcionamento – os de Amauri dos Santos (Barra do Sambaqui) e Djalma Teodoro Dias (Barreira/Santo Antônio).



Engenho dos Andrade
Praia Comprida/Caminho dos Açores, nº 1180.
Edificação de 1860. Pertence à família de Agenor de Andrade (falecido). Última farinhada tradicional: 1987. Desde 1998 abriga a Divina Farinhada, abrindo a Festa do Divino Espírito Santo (setembro). O conjunto casa e engenho foi tombado como patrimônio histórico-cultural pelo Município em 1995 (a pedido da família), e pelo Estado em 2000. Tramita no Iphan o tombamento federal.

Engenho de Djalma Teodoro Dias
Fica na rua Teodoro Manoel Dias, localidade da Barreira (Santo Antônio de Lisboa), junto ao trevo de acesso ao distrito na SC-401. No local havia um engenho tocado pela família Damasceno que se deteriorou com o tempo. Foi adquirido de Durval Pires da Cunha que não durou muito tempo. O engenho atual foi montado por Djalma, abrigado por construção de alvenaria (tijolo a vista) em 2001.

Engenho de Amauri dos Santos
Rodovia Isid Dutra (estrada geral da Barra do Sambaqui), nº 1.245. Erguido por volta de 2001. Anteriormente a família usava o engenho de Aurino dos Santos (irmão de Amauri), localizado um pouco após a Capela da Santa Cruz e São Sebastião. Depois que o engenho de Aurino foi vendido Amauri montou o seu. Seu funcionamento integra a programação anual da Festa da Santa Cruz da Barra do Sambaqui.



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OUTONO

Por Emanuel Medeiros Vieira

PARA MEUS IRMÃOS

Que é feito de ti, remoto/Verbo divino
Encarnado/Que é feito de vós, ó sombras/Que o
O tempo leva de rastos? (Cecília Meireles)


No crepúsculo:
pretérita dor faz rir,
não gargalhada escancarada.

O espelho revela o rosto.
Revela?

O farelo de pão no bigode,
navalha em desuso,
retratos mortos na parede.
Mortos?
Riem: não o sorriso estóico,
mas da felicidade que não sabe que é feliz.
(Descobre-se mais tarde.)

Meus mortos querem um piquenique,
morango, vinho e pão na grama,
outro domingo, e chove,
todos os anos passaram,
o futuro chegou tão cedo
boné, chinelo, pijama,
papéis escritos na segunda gaveta,
os olhos já não explodem o mundo,
gaita-de-boca, regata,
todas as mão entrelaçadas,
“Sê sábio como quem não fosse” – pedia o professor,
a Morte à espreita na soleira da porta,
“estou pronto”,
estou?
menino na casca,
pássaro cansado/ celebrante.
Sim, um pássaro pousou na janela (é verdade)
e exorcizou este chumbo –
a memória de tantos mortos amados.

Os poetas sempre enxergam antes:
“Se o meu mundo cair, eu que aprenda a
levitar”.

(Brasília, maio de 2006, e Salvador, julho de 2011)

20.7.11

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Dividir para
dominar -
e destroçar


Por Amílcar Neves*

Coisas desta Ilha cosmopolita, tradição que vem desde sempre quando cansavam de passar por aqui navegantes do mundo inteiro, tradição que se manteve com o porto existente no Centro da cidade, tradição que prossegue mesmo depois que, por incrível que pareça, o porto foi aterrado: aqui se encontra gente de todos os lugares.

Na terça-feira passada a Regina Carvalho estava lançando na Academia da Cerveja o livro Gregório de Matos - Poemas, organizado por ela. No térreo do bar, encontro o Edir Vidal, amigo de longa data, que me apresenta à Angélica e ao Jorge, amigos seus que passavam uns dias no frio catarinense, num roteiro que incluiu os altos de Urubici. Paraenses, eles moram no Amapá, lá em cima, já no Hemisfério Norte, onde reina o verão.

Como me pareceu lógico, comentei que a coluna Contexto do DC do dia seguinte publicaria uma crônica minha tratando exatamente da pretendida divisão do Pará em três estados, com plebiscito marcado para dezembro próximo.

- É verdade - comentou o Jorge -, há vantagens e desvantagens nessa divisão. Só não sei ainda qual lado pesa mais.

- Com os novos estados - arrisquei - a destruição da floresta amazônica será acelerada.

- Destruição da floresta? - admirou-se a Angélica. - Mas isso já está acontecendo há muito tempo, com ou sem divisão.

Fiquei chocado: a destruição da floresta não parece ser um dado da questão, não conta como vantagem nem desvantagem, simplesmente é um fato que fica por conta do inevitável: fatalmente a floresta será destruída, ou está sendo francamente devastada, é o que eles me dizem, não há o que se fazer com relação a isso.

Assim, jogamos fora, por pura ganância das nossas elites, a riquíssima biodiversidade da floresta, nossa fábrica de oxigênio global e a valiosíssima e abundante água potável, fatores que nos garantiriam a sobrevivência e a supremacia mundial.

* * *

Não poderia deixar de fazer dois rápidos registros sobre fatos do último final de semana.

O primeiro refere-se ao profundo senso de solidariedade que une os povos do Brasil e da Argentina em todas as suas manifestações. Inclusive no futebol. No ano passado, caímos nas quartas de final da Copa do Mundo realizada na África do Sul: no dia 2 de julho perdemos para a Holanda por 2 a 1. No dia seguinte, solidários, mas exagerados, os argentinos também saem nas quartas, frente à Alemanha, tomando 4 a 0. No sábado agora, eles empatam com o Uruguai inclusive na prorrogação e são eliminados, nas quartas de final da Copa América que estão sediando, na decisão por pênaltis. No dia seguinte, solidários, mas exagerados, empatamos com o Paraguai e, na decisão, conseguimos errar os 4 pênaltis que batemos - aos guaranis foi suficiente marcar duas das três penalidades que cobraram. Terminamos em oitavo lugar numa competição com 12 seleções.

O outro registro é sobre jogadores brasileiros: no ano passado, o técnico Dunga, da Seleção, foi crucificado por não ter convocado Neymar, Pato, Ganso e outros bichos mais, nossos garotos de ouro, imbatíveis, novos Pelés que trariam a Taça pra casa. O técnico disse que os meninos ainda não estavam maduros para uma Copa, para a Seleção. Com a desclassificação, Dunga foi degolado por ter sido burro, teimoso e porque não trouxe o título. Agora, os três eram titulares e a Taça também não veio. Curiosamente, nenhum deles terminou a partida contra o Paraguai: foram todos substituídos, dois deles na prorrogação. Será que alguém já pediu desculpas ao Dunga?


*Amilcar Neves é escritor com oito livros de ficção publicados. A partir de 1.7.2011, é candidato à Cadeira nº 32 da Academia Catarinense de Letras. Crônica publicada na edição de hoje (20.7) do jornal Diário Catarinense (Florianópolis-SC). reprodução autorizada pelo autor.
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TRISTE UNE


Por Emanuel Medeiros Vieira

Triste UNE!

Participei do CPC (Centro Popular de Cultura) da UNE (União Nacional dos Estudantes), logo após o golpe militar.

Sinceramente, nosso projeto era algo idealista, “desaparelhado”, sem busca de pecúnia e, muito pelo contrário, nunca encostado nas tetas do Executivo.

Éramos perseguidos!

Mesmo nos governos de Juscelino e Jango, antes do golpe, com altivez ela questionava os seus projetos.

Hoje?

Degradada UNE!

Aparelhada, subalterna, subserviente, covarde, nas mãos dos PCdoB, recebe polpudas verbas do governo e fecha os olhos para as suas tramóias.

Os professores do Rio de Janeiro estão em greve –-, terra do governador Sérgio Cabral, amigo dos empreiteiros –, e a UNE não dá um pio.

Pobre UNE (pobre de ideais – entendam bem).

Subserviente UNE!

Ela não se manifesta sobre o mensalão , aloprados, escândalos, balcão de negócios na Casa Civil, corrupção no ministério de Transportes e em outros órgãos. Nada.

E uma poeta que também trabalha com atriz, afirmou que, com o PT, seus “amigos estavam no poder”.

Só se forem os amigos dela.

E a UNE? Bico calado para continuar recebendo pelo seu indecoroso silêncio.

A UNE que lutou contra o nazi-fascismo, de tantas lutas heróicas, agora só quer privilégios, mamatas, “bocas”.

No seu último congresso, terminado no final de semana em Goiânia, a aviltada entidade chamou o Lula (tão complacente com a corrupção) para falar, para dizer suas platitudes – o mesmo homem que disseque “ler dá azia”, e hoje só gosta de viajar de jatinhos.
Não gostou que chamassem a UNE de chapa-branca.

É que Lula e sua camarilha detestam a verdade.

E ele ainda foi aplaudido!

E quem financiou o “convescote”?

Petrobrás, Eletrobrás, Caixa Econômica Federal, ministérios do Turismo, Saúde, Esportes.

Sem esquecer o apoio da Prefeitura de Goiânia, do Governo de Goiás e da Confederação Nacional dos Transportes (CNT).

Dinheiro de quem?

Teu – caro leitor -, meu, nosso.

Comíamos pratos-feitos, viajávamos de ônibus de Porto Alegre para Salvador, sem dinheiro no bolso, parando em pensões pulguentas.

Queixas? Nenhuma. Havia um sonho.

Sim, havia.

Não é o elogio do sofrimento. Tomávamos nossas caipirinhas, também festejávamos e, como diria Manuel Bandeira, havia morenas bonitas para a gente namorar.

Mas não nos vendíamos.

O verbo é esse: VENDER.

A alma, não!

Queixa? Nenhuma. Havia um sonho.

Agora? Hotéis cinco estrelas, boates luxuosas: é isso o que quer essa estudantada aparelhada (ou “pelegada”?)!

UNE chapa-branca: teus fantasmas te assombrarão!

Foi vendida na bacia das almas, uma entidade que, um dia, mereceu o respeito do povo brasileiro.

Ela tem dinheiro! Mas também merecerá sempre o nosso desprezo e a nossa repulsa.

A outra UNE, não. Está no nosso coração. Mas, hoje, é apenas um retrato na parede.

(Salvador, julho de 2011)

17.7.11

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UM MORTO QUE
VOLTOU À VIDA

Olsen Jr
*
Santo Antônio
com neblina

Ensaio em 14.7.2011


Fotos: Celso Martins








*

UM MORTO QUE
VOLTOU À VIDA


Por Olsen Jr.

(Para Eduardo, Sérgio e Ricardo da loja
“Aguiar Materiais de Construção” que
acompanharam esta desventura).


No meu tempo de guri quando alguém se envolvia em uma atividade fora de sua área profissional e não se dava bem, costumava-se justificar o fracasso com a frase “Quem mandou se meter de pato a ganso”.

Abstraindo o fato de termos dois jogadores na seleção brasileira que atendem por ambos os codinomes, o assunto aqui é outro.

É inverno, são 06h da manhã, estou no banho e ouço o estalo de que rompeu a resistência do chuveiro... Por experiências anteriores, sei que é tudo muito rápido. Num gesto mecânico jogo a cabeça para baixo da água e mal consigo remover a espuma e ela já está fria, depois foi no sacrifício mesmo.

Visito várias lojas antes de encontrar uma peça para reposição (ainda bem que alguns locais abrem aos domingos) e compro logo duas. Em casa, faço tudo como manda a técnica: desligo os disjuntores, substituo a peça queimada, deixo encher o bulbo de água e depois ligo o dito cujo. Não funciona. Abro tudo novamente e ponho ambas as mãos para ver se a resistência (com aquele carinho) resolve dar sinais de vida. Nada. Só então me dou conta que se estivesse funcionando mesmo eu estaria morto.

Volto até a loja, compro um chuveiro novo e ligo para o eletricista que me indicaram. Ele chega no horário combinado (deduzo que, com aquela pontualidade, não pode ser um nativo) e vou cuidar dos meus afazeres enquanto faz a troca do equipamento. Pouco tempo depois ele pede para eu ligar o disjuntor. Digo que está tudo ligado. Ele afirma que não, daí eu vou verificar... Para surpresa minha, de fato, estava desligado aquele que atendia ao chuveiro. Só então cai a ficha. Depois que troquei a resistência, por uma ação dos deuses que amparam os poetas e boêmios, inexplicavelmente, o disjuntor que era o do chuveiro ficou desligado. Comento com o eletricista e ele diz que sou um homem de sorte. Por outro lado, se na hora em que troquei a peça, o chuveiro estivesse funcionando eu não iria por as mãos lá dentro, mas também não iria pagar para ver. Pergunto como ele sabia que estava desligado, ele me mostra uma chave que mede a passagem da corrente elétrica, era um profissional...

Depois que ele foi embora, mais calmo, comecei a pensar em como a vida pode ser boa... Eu que já andava meio descrente... Altruisticamente vou perdoar aqui todas as pessoas para as quais emprestei dinheiro e nunca me devolveram (vocês não iriam devolver mesmo)... Porque “meus caros” a partir de hoje, já estou no lucro e, palavra de escoteiro, alô C. Ronald (o poeta ermitão, uma pessoa generosa, pena que nem todos o entendam, eu inclusive), mas preciso fazer uma confissão: de todos os males, é melhor viver, nem que seja em Biguaçu!



14.7.11

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Troca-troca na SC 401
Loja no lugar de O Estado
e o DC onde estava a loja
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Especial: MARCELO, por
Emanuel Medeiros Vieira

Ostras nativas na orla. Foto: Celso Martins

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TROCA-TROCA NA SC 401



O prédio em que funcionou o jornal O Estado, nas margens da SC-401, está sendo transformado em uma loja da DellAnno. A guarita de entrada foi posta abaixo nesta quarta-feira (13.7). Outras pequenas modificações serão feitas, mas a estrutura original, ao que parece, será mantida.

Por outro lado, o imóvel na mesma SC 401 ocupado atualmente pela DellAnno, será adaptado para receber até o final do ano toda a estrutura do jornal Diário Catarinense, com cerca quase 800 funcionários. (Por Celso Martins, texto e fotos)


Fotos em 13.7.2011. Hoje de manhã (14.7) já não restava mais nada da antiga guarita, apenas os fantasmas do Aranha e do Sérgio.


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M A R C E L O

(Em memória do meu sobrinho, afilhado de Crisma e
querido amigo Marcelo Tadeu Vieira de Córdova)

Por Emanuel Medeiros Vieira


Querido Marcelo

Estava me lembrando de uns acampamentos que fizemos juntos.

De tantas andanças, peregrinações. Quanta coisa para contar!

Valerá apenas acumular? Acho que não.

Eu que lido, diariamente, com as palavras mal rompe a aurora, observo pela janela umas crianças brincando.

Já escrevi sobre tantos mortos amados e não sei mais o que podem significar as palavras.

Recordo dos nossos passeios de bicicleta. As idas à Lagoinha, aos Ingleses, à Imbituba, os passeios todos numa ilha (será a idade que me deixa mais nostálgico?) mais amorosa.

Ah, as viagens a Porto Alegre.

Quantas conversas! Muitos já escreveram sobre a tua partida.

Por mais que tente, racionalmente dizer, que a maturidade nos prepara mais para as perdas, sei que não é verdade, mas defesa, truque mental, mecanismo compensatório.

Acho que a gente nunca vai estar preparado plenamente para as perdas.

Quando contaram, não “quis acreditar!

Os tragos no “Roda Bar”, nos bares perto de ruas vividas por ti e a tua família: Alves de Brito, Rafael Bandeira, depois na Artista Bittencourt.

E em tantos outros lugares.

Ias ao Bom Abrigo, Chácara da Espanha e nas duas casas em que vivi na Lagoa, quando morei aí.

Marcelo, Marcelo.

Para mim, o que mais ficará? Não sei. Talvez o teu jeito solidário, prestativo, fraterno, aquela “contenção” que não camuflava o humanismo e a generosidade.

Me doi falar no passado.

Poderia cair em lugares-comuns. Não, não quero isso. Nos reencontraremos? Não sei, não sabemos. Ninguém voltou para contar.

Fica essa memória tão intensa.

E penso em ti, na tua família original, na formada, na Cassinha, no João, nas tuas irmãs Rosângela, Raquel e Mirinha. E nos teus filhos Enzo e Júlia.

Que buraco enorme sentem os vivos!

Que luto danado! Que sensação perturbadora!

O tempo nos ajudará? Sim. Mas a saudade sempre fica.

A vida não foi fácil, Marcelo?

Falemos francamente: ela nunca é.

Eu era um tio – mas te sentia mais como grande amigo.

Os que são teus contemporâneos poderão dizer outras palavras.

O s que vieram depois , também.

Ou antes, como eu, o tio Tadeu, de 1945...

Celebrações, bodas, cemitérios, festas, casamentos, separações. O que dá certo. O que não dá certo.

Que nos conhece verdadeiramente?

Conhecemos os outros?

Nossa meta não deve ser a perfeição, mas a plenitude.

Um indivíduo, na sua inteireza, não é sempre inatacável, sem culpa, puro, mas é aquele em que , não se sabe como, todos os aspectos foram integrados num ser total.

Meu amigo Marcelo foi assim.

Estou lendo um calhamaço de 734 páginas, “Fernando Pessoa – uma quase autobiografia”, de João Paulo Cavalcanti Filho.

Antes da tua passagem, já começara a ler.

E em muitos versos de Pessoa me lembrei de ti.

Queria te dedicar um livro.

“Ofereço-te este livro porque sei que ele é belo, inútil e absurdo. Que seja teu como a tua Hora”.

Palavras do heterônimo de Fernando Pessoa – Bernando Soares, no “Livro do desassossego”.

Eu sei: somos mil, tantos, múltiplos. E haverá para toda essa hora da Revelação.

Queria mais fundo, falar de outros acontecimentos vividos juntos, mas não consigo.

Paro, penso na família, olho novamente as crianças brincando – uma solta uma pipa, e um pássaro pousa na janela.

Alegrias, tristezas, decepções, depressões, esperanças.

Tudo passa.

Mas não esquecerei daquela sinuca numa tarde nos Ingleses, eu, tu e o César – sim, uma outra ilha, e éramos mais novos.

Teu papel foi cumprido.

O sobrinho e amigo alcançou aquilo que mais amo no ser humano: a generosidade e a compaixão

Farás muita falta. Estás fazendo.

Beija os teus avós por nós todos.

Abraça o Pepe, a Giocondinha, o Alfredo David, a Patrícia: os outros sobrinhos que já partiram. Pensando bem não é correto os sobrinhos irem antes dos tios, os filhos antes do pais. Dá um beijão na Cassinha e um abração no João Córdova, no Luiz, no José. Na Gioconda, na Rosa, no Pedro, na Ornilda. Em todos que já se “encantaram”.

A vida. Ela é.

Ah, naquele dia remoto na Lagoa, o Luiz te deu o carro para dirigires. Conhecias todas as marcas. Tinhas 14 anos (creio). Era dezembro de 1970.

Vou terminar com duas citações:

“Quando o fim chegar, deixarei a minha vida do mesmo modo, como se estivesse deixando uma hospedaria, e não o meu lar, porque penso que minha estada nesta vida é temporária. E que a morte é apenas uma mudança para outro estado.”

(Cícero – 106 a.C – 43. a.C)

“Tudo passa – sofrimento, dor, sangue, fome, peste. A espada também passará, mas as estrelas ainda permanecerão quando as sombras de nossa presença e nossos feitos se tiverem desvanecido da Terra. Não há homem que não saiba disso. Por que estão não voltamos nossos olhos para as estrelas? Por quê?”

(Mikhail Bulgakow (1891-1940).

Marcelo: um beijo no teu coração: do Tio Tadeu – também teu xará...

(Salvador, julho de 2011)

13.7.11

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AMÍLCAR NEVES E
EMANUEL MEDEIROS VIEIRA



Entardeceres no Sambaqui. 11.7.2011. Fotos: Celso Martins

Então vejamos

Por Amílcar Neves*

A notícia é deprimente: "O desmatamento na Amazônia em maio aumentou 144,4% em relação ao mesmo mês de 2010. Foram 268 km² de área desmatada contra 109,6 km² no mesmo período do ano passado." Isso dá dois terços da Ilha de Santa Catarina (424,4 km² de superfície) só num mês de devastação. Mantida a média, serão sete ilhas e meia de floresta erradicada em um ano. Nuvens sobre a região, porém, permitiram que satélites observassem e comparassem menos da metade, apenas, de toda a Amazônia.
Mato Grosso, Pará e Rondônia têm sido os grandes campeões dessa corrida sinistra. Pará vai perder o posto assim que o estado for dividido em três. Tapajós e Carajás, maiores do que o Pará remanescente, vão incrementar esse ritmo alucinante, pois terão que construir, em suas capitais, muitos prédios públicos e privados a fim de abrigar os novos serviços indispensáveis às suas estruturas; e estender muitos quilômetros de asfalto a fim de unir entre si suas cidades perdidas no meio da mata; e emancipar dezenas de novos municípios a fim de supostamente melhor assistir aos seus sequiosos habitantes e, na verdade, criar mais prefeituras, secretarias, câmaras de vereadores e assessorias; e implantar muitas fazendas mais para a criação de gado e a plantação de grãos a fim de alimentar a sua gente e exportar o excedente, pois suas populações crescerão de maneira vertiginosa e famélica mas também exigirão renda e salário. "Precisamos progredir!", bradarão ufanosos, ufanistas, reclamando verbas federais sem fim, os governadores dos novos estados.
Se, depois disso, sobrar pouco espaço para a saudosa Floresta Amazônica, paciência!: o progresso vem mesmo a galope e nem pede passagem, atropela tudo o que se puser em seu caminho.
Pior ainda é que sobe a 60% o desperdício da madeira nativa da Amazônia, extraída de áreas de manejo autorizado ou por desmatamento ilegal: devido a um beneficiamento ineficiente, perde-se esse volume imenso que não chega à construção civil nem à fabricação de móveis.
Ruralistas e evangélicos, gente que costuma prezar ao extremo os seus respectivos negócios, altamente lucrativos, em regra relegando a último plano o interesse social e o bem coletivo, são os grandes impulsionadores da retalhação do Pará - para melhor dizimá-lo. Pouco importa a destruição da inestimável riqueza que é a diversidade biológica da Amazônia (mas também do Pantanal, da Mata Atlântica, do cerrado e da caatinga), o que é preciso é botar abaixo o que for possível de matagal confiando num suposto perdão que será, ou seria, concedido àqueles que desmataram antes da aprovação do novo Código Florestal Brasileiro. Daí a fúria incansável com que são tracionadas feito navalhas traiçoeiras grossas correntes presas a possantes tratores num arrasto impiedoso e indiscriminado, criminoso, como se árvores da floresta fossem tainhas no mar.
Temos culpa, aqui, e damos péssimo exemplo, quando permitimos a aprovação do malsinado Código Ambiental de Santa Catarina, que submete o meio ambiente ao interesse econômico, que compromete o futuro e a sobrevivência em nome de uma autonomia irresponsável, egoísta e imediatista. Aqueles que deveriam representar os interesses da população e lutar até o fim pelo bem comum, vendem-se a conveniências partidárias e, especialmente, a projetos personalistas - e, cada vez mais, deixam de lado o sentido figurado da palavra e vendem-se por dinheiro mesmo.
Há 30 anos já advertia Ignácio de Loyola Brandão: Não verás país nenhum.

*Amilcar Neves é escritor com oito livros de ficção publicados. A partir de 1.7.2011, é candidato à Cadeira nº 32 da Academia Catarinense de Letras. Crônica publicada na edição de hoje (13.7) do jornal Diário Catarinense (Florianópolis-SC). Reprodução autorizada pelo autor.




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SÓRDIDO E IGNÓBIL
ATAQUE À UnB EM
MATÉRIA DE ESGOTO
DA DIREITA BRASILEIRA

Por Emanuel Medeiros Vieira

Para a minha filha Clarice, que com sensibilidade, garra e talento estudou na humanística e digna UnB
E em memória de Honestino Guimarães -asassinado pela ditadura militar

POR FAVOR, DIVULGUEM!

As ideias que gestaram a UnB são das mais generosas que a América do Sul já conheceu.
Era um sonho maior.
Mesmo interrompido pelo Golpe de 1964, ele não morreu.
E continua crescendo.
Da maneira mais sórdida, vil e ignóbil, em matéria escrita no esgoto da direita brasileira, pela revista "Veja" - cada vez mais reacionária, rancorosa, fundamentalista, beirando o fascismo - a universidade é atacada.
Em verdade, quem é atacado é o humanismo.
E a esperança
Os ratos não sabem conviver com o humanismo.
Os fascistas não querem a diminuição da desigualdade.
Só falta, a "Veja" berrar - como o general fascista na Guerra Civil Espanhola: "Abaixo, a inteligência! Viva a morte!"
Não me alongarei.
Doi ver que jovens jornalistas estão vendendo tão cedo as suas almas aos podres poderes, em troca de pecúnia ou de desonrosas intenções.

Quem me lê, conhece minhas viscerais diferenças em relação ao PT.
Condeno o partido por outros motivos e razões, como a negação dos princiípios republicanos.
É outra coisa.
Uma matéria contra a UnB é muito perigosa para quem desconhece sua história, ainda mais em tempos tão áridos, medíocres, individualistas e pós-utópicos.
(Brizola dizia que os fundadores da editora que publica a revista eram mafiosos fugidos da Itália.)
É preciso não se calar!
É preciso dizer não!
Reitero: disseminem a mensagem para mostrar que a UnB não está só. E que enfrentou períodos mais ásperos.

Salvador, jullho de 2011



12.7.11

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Aquiles de Emanuel
e o casal de tucanos


Visitantes ilustres em árvore no quintal de casa. Foto: Celso Martins


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A Q U I L E S

Por Emanuel Medeiros Vieira



À vida calma, optou pela guerra: Aquiles.

Tétis, tua mãe, matava seus filhos querendo imortalizá-los,

mas quando nasceu o sétimo, resolve banhá-lo no Rio Stix,

segurando-o pelos calcanhares:

seu corpo não é mais vulnerável

(fica apenas com um único ponto fraco).

Esta mesma mãe te adverte, antes que partas para Tróia:

“Morrerás em breve, mas tua fama será eterna.”

(Escolhes a fama e a morte rápida.)

E o guerreiro comandará frota de 50 navios.

Não indo para a luta, teu destino será a morte por velhice.

Aquiles: o oráculo avisou teu pai, Peleu, que morrerias

junto aos muros de Tróia.

O pai tenta ludibriar a profecia: disfarça-te como mulher e te esconde.

(Outro oráculo disse a Ulisses que Tróia não seria conquistada, se Aquiles não fosse junto.)



Voluntarioso, não escutaste a ordem de Apolo para não

seguires adiante.

Segues: então, o deus guia uma flecha para o teu calcanhar,

guerreiro Aquiles.

É a mão de Páris que a envia, e a flecha revela teu

ponto fraco e tua finitude, que não te permitiu a

velhice.

Te apaixonas pela filha de Príamo, Polixena,

mas o amor não é mais possível:

o tempo é de guerra.



Tróia está perdida,

como o destino de todas as gerações que

“caem como as folhas das árvores”.

(Homero na “Ilíada”.)

Então, Ulisses desce ao Hades e encontra os mortos da guerra de Tróia.


Tucano nos fundos de casa. Foto: Celso Martins

8.7.11

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MONTANHA VIVA

Pedida a criação
de uma unidada
de
conservação
em Anitápolis



A Associação Montanha Viva acaba de pedir oficialmente a criação de uma unidade de conservação em Anitápolis, na região da Grande Florianópolis, atualmente na mira de uma empresa fosfateira. O pedido foi protocolado no Instituto Chico Mendes da Bioversidade (ICMBio) em Florianópolis na última quinta-feira (7.7).

Confira abaixo a integra a nota da Montanha Viva informando sobre o pedido.

A Associação Montanha Viva, comunica por meio de seus advogados que, no dia 07 de julho de 2011, deu entrada no ICMBIO, através do protocolo n.º 0268497, do pedido de IMPLANTAÇÃO DE UNIDADE DE CONSERVAÇÃO NA CATEGORIA REFÚGIO DA VIDA SILVESTRE, NA REGIÃO DOS RIOS DOS PINHEIROS, MUNICÍPIO DE ANITÁPOLIS, PARA PROTEGER ESPECIES AMEAÇADAS DE EXTINÇÃO.

Por fundamento tem-se a proteção espécies de flora: canela sassafrás, peroba-veremelha, a canela fogo, tanheiro, o cedro, a araucária, o xaxim- bugiu etc. ameaçadas de extinção pela Portaria IBAMA n.º 37/92 e de avifauna listadas 168 espécies de aves, das quais 141 identificadas dentro da área do empreendimento e 70 no entorno deste, sendo a ÁGUIA CINZENTA e o PAPAGAIO DE PEITO ROXO, duas das espécies também listadas como em perigo de extinção, além de mamíferos, e uma espécie de anfíbio não identificada.

Tais dados foram extraidos do estudo de impacto ambiental elaborado por consultorias contratadas pelas empresas BUNGE FERTILIZANTES, YARA FERTILIZANTES S.A, bem como, pareceres técnicos do IBAMA, Ministério Público Federal e Comitê de Bacias Hidrográficas do Rio Tubarão.

A entidade espera com esse gesto proteger não apenas as espécies consideradas em perigo de extinção que foram identificadas, bem como outras que talvez nem tenham sido. Mas principalmente, deseja proteger a espécie humana, cuja dependência e sobrevivência estão intimamente relacionadas com o uso qualitativo dos recursos ambientais disponíveis e ainda em equilibrio na Região do Rio dos Pinheiros.

Pois entende que preservar a Região e seus manancias é preservar toda cadeia produtiva da agricultura orgânica através do reconhecido Projeto Acolhida na Colonia e da Agreco, é preservar também o Projeto Mel das Encostas. E se tais motivos não forem suficientes busca também manter a qualidade da água consumida na Região de Braço do Norte e captada pela CASAN, que recebe importante carga do Rio dos Pinheiros.

Por fim a entidade Montanha Viva, conclama a todos a participar desse novo desafio, que antes de mais nada busca à preservação da vida em todas as suas formas”.


6.7.11

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Aníbal, Pedro
e outro povo
também real


Por Amílcar Neves*

Ninguém mais escreve cartas, seja de próprio punho, seja, mesmo, pelo computador, pelo celular ou pela tabuleta (ou tablet, também conhecida como tabuinha ou prancheta, para os que não sabem do que cá se fala) para depois imprimi-las e enviá-las da forma tradicional. Ninguém mais escreve cartas, ninguém mais vai ao Correio, instituição anacrônica que não há quem consiga explicar como ainda permanece viva, pois hoje tudo se dá, se faz e acontece pela internet, assim como antes só acontecia se tivesse dado na televisão. Exemplos mil existem por todos os cantos.

Se ninguém mais escreve cartas nem, claro, vai mais ao Correio, só pode beirar o absurdo, ser o fruto podre de uma mente doentia e em franco processo de decomposição, uma narrativa que comece assim:

"Eles se encontraram por acaso na agência do Correio."

A admissão da casualidade, a pretensão de que o encontro tenha ocorrido por acaso, é o que mais depõe contra a seriedade do texto e a sanidade mental do autor. Não existem acasos nem coincidências no Correio. Não existem pessoas se esbarrando no Correio.

Eles se encontraram por acaso na agência do Correio. Aquele que veio depois olhou atentamente para o sujeito à frente, postado meio de lado, examinou os poucos traços do rosto que lhe ficavam visíveis, analisou cor e corte do bigode, aspecto e textura da pele e, convicto da verdade, adiantou-se, batendo-lhe amistosamente nas costas:

- Doutor Aníbal! Que bom te ver, meu caro amigo, meu grande colega de faculdade! Há quanto tempo!

O outro virou-se sorridente - o Aníbal não era Aníbal - e disse:

- Fico satisfeito que tenhas me confundido com alguém por quem, a julgar pelo tom da tua voz, tens uma amizade profunda. Podias ter pensado que eu fosse um inimigo e chegado me agredindo. Bom dia, amigo, o meu nome é Pedro - e puseram-se os dois a conversar como velhos amigos.

O sábado, pois, começava bem, independente e apesar do tempo (chuvoso, friorento) que fazia lá fora. Ao chegar ao carro, o amigo do Aníbal, e também do Pedro, foi abordado por um homem que pedia dinheiro para comprar pão para a filhinha:

- Já consegui um leite, que me deram ali - e apontou vagamente para um lugar indefinido qualquer. - Queria agora levar um pãozinho para ela - falava um português cultivado.

- E o que fazes na vida? Qual é a tua idade? - quis saber.

- Estou na condicional, faltam 17 dias para terminar. Trabalho como pedreiro, tenho 28 anos e andei fazendo umas bobagens na vida. O dono da empresa disse que vai me fichar se eu não tiver problema nenhum até o fim da condicional. E não vou ter.

- O que andaste aprontando para te enfiarem em cana?

O homem ficou sério um instante, depois levantou a camisa e revelou uma barriga retalhada de cicatrizes.

- Tiros e facas. Quase morri, todo arrebentado. Me meti com roubo, tráfico de drogas e assalto à mão armada. Mas nunca matei ninguém, sorte minha, por isso consegui a condicional.

- Droga também?

- Claro. Bagrinho como eu entra pro tráfico pra pagar o consumo pessoal. Coisa de otário. Se não pagar, os caras te apagam. Me dou por feliz por ter escapado disso tudo, hoje estou limpo. Só penso agora na minha criança, quero dar uma vida decente pra ela. Quero que ela possa olhar bem dentro dos meus olhos. Obrigado, senhor, vou falar agora com aquela mulher ali, ver se ela me arruma mais umas moedinhas, esse pouco para mim é muito, muito obrigado mesmo, de coração.

O sábado prosseguia. Bem, ao que parece.


*Amilcar Neves é escritor com oito livros de ficção publicados e candidato à Cadeira nº 32 da Academia Catarinense de Letras, que tem Manoel dos Santos Lostada como patrono e ocupada até recentemente pelo presidente da instituição, Lauro Junkes. Crônica publicada na edição de hoje (6.7) do jornal Diário Catarinense (Florianópolis-SC). Reprodução autorizada pelo autor.

5.7.11

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Casarão da ABS/Ponta do Sambaqui. Maio de 2011. Foto: Celso Martins



A F E T O

Por Emanuel Medeiros Vieira

“Se não for pela poesia, como crer na eternidade?”
(Alphonsus de Guimaraens Filho)

Sobra este afeto
(a muralha que me resta).

Sim, é este patrimônio que me cabe-
sem valor contábil,
o que amo,
contra o ruído, o mal e a bofetada.

Tribo perdida,
só queremos saber de nós mesmos.
Minha verdadeira cidadela é o território dos afetos.
transformado estou: no guerreiro que não me
imaginava mais, exaurido: ainda assim combatente.

Restaurado o menino que viu a regata:
é esta matéria mnemônica que tento re-fundar aqui,
papel em branco, nova manhã.

O latim do colégio ensinava que “recordar” vem de:
“recordis”:
tornar a passar pelo coração.
(A poesia perpetuará esta fugaz manhã, despistando a
morte?),
vem, menino, sossega o coração na manhã azul,
me legitima na palavra escrita,
eterniza o poema para os que vierem depois:
é minha oferenda (o sentido desta peregrinação).

3.7.11

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Emanuel? Itamar!
Olsen? Gripe com arte!

*

Esperando o frio chegar

Os órgãos de previsão do tempo indicam muito frio nos próximos dois ou três dias. Neste momento (meio dia, 3.7) estamos com uma sensação térmica por volta de 7ºC, conforme o Ceptec-INPE. O Ciram-Epagri prevê temperaturas abaixo de 5ºC no litoral.

*
I T A M A R



Por Emanuel Medeiros Vieira


Para Marcelo Tadeu Vieira de Córdova – sobrinho, afilhado de Crisma
e sempre amigo, que se “encantou” em 28 de junho.



Não, quero monumentalizar a figura de Itamar Franco, falecido no sábado, 2 de julho.

Mas QUANDO A POLÍTICA NACIONAL PARECE UM VALHACOUTO DE PATIFES E DE CORRUPTOS, a morte de um homem de bem, que exerceu altos cargos com dignidade, gera um sentimento de orfandade.

Sem nostalgia: poucas vezes na história do país, percebemos a predominância de tanta gente má e indigna, que se serve da política e não serve ao país.

Sim, orfandade.

Não me interessam alguns falsos discursos ideológicos que, muitas vezes, são mecanismos compensatórios para aproveitadores.

Queremos homens de bem!

Queremos gente de caráter!

Sou deu uma geração que ainda acompanhou o trabalho de Ulysses Guimarães e de Tancredo Neves.

Fui amigo de Chico Pinto, de Luiz Travassos e – na Ilha –, de Adolfo Dias, de Roberto Motta, de Jarbas Benedet, de Alberto Albuquerque e de tantos outros homens honrados.

Vai-se Itamar, corajoso, decente e polêmico.

Quem fica?

No Senado?

José Sarney, Romero Jucá, Gim Argello, Ideli Salvatti (quando voltar) e outros exemplos de “devoção à causa pública”.

E citei poucos!

É de causar asco!

Lembro das palavras de Carlos Castãneda (para que o desânimo não se irradie): “SABEMOS QUE NADA PODE TEMPERAR TANTO O ESPÍRITO DE UM GUERREIRO QUANTO O DESAFIO DE LIDAR COM PESSOAS INTOLERÁVEIS EM POSIÇÕES DE MANDO.”

(Salvador, julho de 2011)

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GRIPE COM ARTE

Ilustração: Uelinton Silva

Por Olsen Jr.

Um dia você acorda gripado. Sabia por determinados sintomas que a virose estava instalando-se, mas não tomou providência nenhuma e aconteceu. Aí, duas atitudes sensatas, a primeira é a de ficar em casa para não disseminar ainda mais o vírus evitando contaminar outras pessoas e a segunda, se a doença tem um ciclo, o melhor é tirar proveito do que for possível sem maldizer o que poderia ter sido feito e não foi.
Cabeça pesada, abulia e uma coriza impertinente embotando qualquer iniciativa para o trabalho, então, tome um banho, o velho Vick VapoRub (mentol, cânfora e óleo de eucalipto) para desobstruir as narinas e vá dormir.
Desperto algumas horas depois com fome. Chove lá fora e está frio. Não há indícios de que a situação vá se alterar. Você sabe que está sozinho e uma eventual mortificação não muda nada, então, mãos à obra. Um incenso indiano lá na sala pode melhorar o astral; jazz e blues para elevar o espírito e claro vamos preparar algo para o poeta.
Lembrei da dobradinha do Bar do Paulinho, para uma emergência como esta... Fui coligindo os ingredientes, um tomate médio sem pele e sem sementes, meia cebola, duas cabeças de alho (quase 20 dentes), oliva, manteiga, loro, tinha quase uma xícara de arroz branco (substituiria o pão) e fui dispondo tudo...
Refogo um pouco de alho, cebola e o tomate no azeite, mais uma colher de manteiga, adiciono cheiro verde que tenho sempre (ainda que congelados) um pouco de água quente, deixo no fogo até obter um molho consistente onde ponho a porção da dobradinha que irá descongelar em fogo brando...
Em outra panela, refogo o restante do alho, frito o arroz junto (receita da Dna. Nica), adiciono água quente, um pouco de sal e deixo cozer em fogo baixo.
Com uma colher de pau vou mexendo a dobradinha até se misturar com o molho. Adiciono um vidro de feijão branco da Hemmer e jogo três folhinhas de loro devidamente maceradas que farão a diferença. Antes de servir, um fio de azeite (receita dela), pimenta do mestre Fedoca e dispenso o ovo cozido picado da decoração final...
Descubro uma garrafa remanescente de vinho do Porto, um Messias de uva Tawny... Sei que deveria tomar um ou dois cálices após a refeição, mas quem sobreviveu a um naufrágio não precisa mais racionar a água... Também não esqueci a sobremesa, uma lata de leite condensado fervido em banho-maria (duas horas e meia), receita da Dna. Nica fazendo o melhor doce de leite do mundo...
Lembro naquele neste dia deveríamos celebrar os 13 anos do nosso grupo de estudos, pessoas que se reúnem quando dá, para falar de arte, música, cinema, literatura e que não tem outro compromisso a não ser com este diletantismo. Sem cobranças é o lema, e tem dado certo afinal, quando se quer se pode, então aqui, longe da turma, proponho um brinde a Ela!


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C E N A S
INVERNAIS

Fotos: Celso Martins
















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Crônica casual
Praia Comprida/Caminho dos Açores