9.2.11

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Nelson Motta
Enredo do Baiacu

Raul Fitipaldi
Diploma de jornalista

Urda Klueger
Abya-Ayalla

Praia da Ponta do Sambaqui (Florianópolis-SC). Foto: Celso Martins


BAIACU HOMENAGEIA
O CINEMA NO CARNAVAL

"Pessoal do Cinema de SC!
Não sei se é a primeira vez, mas se não for é uma raridade um bloco de Carnaval de Florianópolis ter escolhido como seu enredo para desfilar o tema do Cinema, principalmente focado no Cinema Catarinense, e com uma letra bem “critica”a situação atual do nosso Cinema, principalmente quanto aos espaços de exibição dos nossos filmes (vejam a letra e escutem o samba através do nosso site wwwbaiacudealguem.com.br). Para quem não sabe o bloco Baiacu e Alguem é um bloco comunitário (comunidade de Santo Antonio de Lisboa), que não tem patrocínio nem público nem privado, mantendo sua autonomia e sendo autosustentável através da venda das camisetas e dos ensaios e ventos que são realizados ( ensaios segundas, quartas e sextas), desfilando pelas réus de S.Antonio na Sexta e na Segunda Feira de Carnaval. Já fizemos parceria com algumas pessoas ligadas ao nosso cinema que muito ajudaram com textos, palestras subsidiando nossa “ala de compositores”na confecção do samba deste ano. Queremos dar continuidade a esta parceria com algumas sugestões. Precisamos de cartazes de filmes catarinenses que serviram de “alegoria”no nosso desfile. Ta rolando uma proposta de colocarmos um telão no caminhão de som, e exibirmos trechos dos nossos principais filmes durante o desfile, estamos vendo como estruturar isto. A Liliane Motta produtora de cinema e nossa vizinha aqui no bairro se propôs a ajudar nisto....temos que viabilizar os telões (2), os projetores etc....quem quiser ajudar ou dar idéias sobre os desfiles estamos abertos a isto, é só comparecer aqui nos ensaios e conversar com a Adriana, Helena ou Daniela que estão vendo esta parte. Por último queremos convidar a todo o “povo”envolvido com o Cinema para desfilar com a gente. Podemos articular uma “pacote”de camisetas para vcs. A 1 preço mais acessível. Só precisamos organizar isto o mais rápido possível pois ‘tá chegando a hora” No site tem nossos fones, mas qualquer dúvida podem ligar para mim 91011183. Apareçam nos nossos ensaios!!! Abs.Carnavalescos Nelson Brum Motta P/Coordenação do Bloco. OS:Pode ser que com isto alguma Escola de Samba de Floripa se sensibilize pelo tema e coloque como enredo nos próximos anos, ao invés de ficar homenageando até Lojas Multinacionais...".

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Atrás de cúmplices

Por Raul Fitipaldi*

A discussão sobre o diploma de jornalista, marcada pelo oportunismo das empresas monopólicas de comunicação, a “fraqueza espiritual” do governo federal e a podridão da Justiça e do Congresso Brasileiro, pretendeu confundir e ocultar o direito das pessoas (incluídos nós, jornalistas) à liberdade de dissentir, de defender suas idéias e de comunicar-se ao seu modo. Tentaram servir um prato feito, no qual o diploma era desnecessário, de modo que as empresas tivessem a liberdade de contratar garantidores de rating ou pagassem salários mais míseros ainda a jornalistas fashion e moldáveis para apresentar seus produtos modeladores de opinião, conhecidos sob a alcunha de notícias. Por tabela, para que o espectro informativo e comunicacional fosse tomado de assalto por opinólogos de ofício e proto-candidatos a qualquer coisa, induziram à idéia de que em nenhum caso é necessária a técnica para que as pessoas cumpram o papel de comunicadores, basta ter acesso a um computador. Comunicar é uma das funções do jornalista, sua finalidade principal, no entanto, o jardineiro e o engenheiro, a nutricionista e a faxineira, todos podem se comunicar, E DEVEM. Às vezes precisa-se de um jornalista, às vezes não; para entrar nos sítios de relação social não se necessita, para garantir a qualidade de compreensão de um texto noticioso sim. No meio disso, há uma parte pequena da categoria jornalística (muito pequena ainda) que dedica boa parte da vida a fazer comunicação e jornalismo de maneira militante, por convicção ideológica, por princípios humanistas, pela sua ética social, pela Soberania Comunicacional da Comunidade e dos Povos.

Santa Catarina vem se servindo de um grupo desses jornalistas vinculados também com diversos grupos de comunicadores sociais formados por intelectuais, trabalhadores, estudantes, agricultores, líderes de setores minoritários da sociedade, ecologistas, e mais. Jamais, em momento algum, nenhuma das profissões dos que exercemos o direito humano da comunicação tem sido empecilho ou vantagem para nosso relacionamento entre nós ou com aqueles que, construindo o dia-a-dia na sua casa, na sua comunidade, na sua família social ou de trabalho, tem coisas a dizer e as publicam.

O extraordinário motivador da nossa vontade comunicacional, para a qual técnicas diversas e conhecimentos variados só vêem a qualificar o que se diz ou se escreve, está formado pelos ingredientes tradicionais da luta contemporânea: a injustiça, a repressão, o desemprego, a miséria, a precariedade, a acumulação da riqueza nas mãos parasitas de poucos, a privatização do Estado e o desleixo do próprio Estado burguês, discriminador e pré-conceituoso.

É necessário que uma trabalhadora possa denunciar que não tem creche para seu filho. Que um agricultor denuncie se é escravizado na sua atividade. Que um advogado denuncie uma injustiça por discriminação de qualquer natureza. Que um jornalista coloque sua técnica à disposição da luta da sua família social. É necessário que todas as vozes e as palavras se reúnam em afã libertador. Para isso a militância comunicacional precisa ser ampla, tolerante, aberta, popular, constante, e deve marchar desde o computador até a rua, o lugar onde dirimimos nosso tamanho perante a exploração.

Esta tarefa de comunicar como alternativa ao poder central dos monopólios privados e do Estado injusto, precisa crescer. Ela é fascinante, é um convite ecumênico onde os ateus ficamos à vontade e dele fazemos parte. É um romance delicado, a pé de ouvido com a nossa grande namorada, a população da qual formamos parte indivisível. É a saborosa cadeia que unindo vocábulos e palavras, frases e mãos se levanta inquieta e sensual para lutar por nossos direitos, os direitos dos pobres e dos livres. Ser cúmplice, ou procurá-los em uma ação amorosa e central que todos, em Rede Popular e Libertaria, devemos formar para conquistar a Soberania Comunicacional. Vamos juntos, jornalistas devidamente diplomados e comunicadores sociais, até que a noite amanheça.

* Raul Fitipaldi é jornalista, coordenador do portal Descato. O texto Atrás de cúmplices foi escrito para a revista Pobres&Nojentas e a Rede Popular de Comunicação Catarinense (RPCC).

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ABYA-AYALLA - OUTUBRO

Por Urda Alice Klueger*

Sempre soube, desde pequena, que as coisas tinham coração, tinham sentimentos, tinham vida, sofriam e eram felizes tanto quanto os seres vivos. Na minha infância, por exemplo, se acontecesse de eu dar uma topada numa pedra, por mais que o meu pé estivesse doendo, eu ficava a imaginar o quanto a pedra se machucara também, e pedia perdão a ela, e assim por diante. Árvores, plantas, por exemplo, eram coisas vivas, e então deveriam sentir e sofrer ainda mais que as outras coisas, e então eu evitava de arrancar qualquer folhinha, qualquer galhinho, e quando me consentia tirar pedacinhos de folhas dos pés de tangerina, para ficar a cheirá-los, a esmagá-los na mão e friccioná-los no corpo por causa do seu perfume que para mim é inigualável, ficava muito apiedada do que sentira o pé de tangerina, e conversava com ele, explicava-lhe dos meus sentimentos e do meu amor por seu cheiro, e lhe pedia desculpas.

Tive que crescer mais um pouco, porém, para entender que não eram só as coisas como pedras, formigas e pés de tangerina que tinham alma e sentimentos: um dia viajei pela primeira vez para a encantada cidade de Salvador, que conhecia quase que profundamente através de um escritor que dedicara sua vida a ela, um baiano chamado Jorge Amado, mas que jamais imaginara que fosse uma cidade com alma. E ela estava lá, a alma de Salvador, batendo fortemente dentro de um coração que se situava bem sob a estátua de Castro Alves, na praça do mesmo nome, sobranceira ao Mar de Iemanjá! Foi uma surpreendente surpresa descobrir aquela coisa, e eu não queria mais sair daquela praça, tentando auscultar as poderosas batidas que vinham de sob ela, entendendo perfeitamente, então, que também as cidades possuem coração e sentimentos!

Descobri o coração de Salvador em 1988; descobri o coração de Abya-Ayalla cinco anos depois, quando me aventurei por países nunca dantes navegados por mim, e fui bater em Sacsayuhaman.

Alguém há de me perguntar o que poderá ser Abya-Ayalla, e então explico: é o nome que muita gente quer que tenha este continente aonde vivemos. Alguém pode até rir, achando que é bobagem, mas esse é um assunto que tem sido seriamente debatido em Fóruns Internacionais, por sérias pessoas que pensam muito seriamente sobre tal possibilidade, e eu já tenho visto uma porção de gente chamando de Abya-Ayalla a este continente que faz uns 500 anos foi batizado de América, por causa de um navegador estrangeiro chamado Américo Vespúcio. Além de saber que era um navegador, e estrangeiro, o que você sabe sobre Américo Vespúcio? Aposto que nada – o que pode representar o nome de América tirado de um navegador que não teve a mínima importância para nós? Pois é, e o nome está aí, durando quase 500 anos.

Abya-Ayalla, no entanto, tem uma significação poderosa: numa das antigas línguas existentes na América Central, ele é traduzido como “Mãe Terra”, ou seja, a mãe de todos nós.

E a Mãe Terra tem coração, tem alma, tem sentimentos?

Tem, e eu descobri tal coisa em 1993, quando fui pela primeira vez a Sacsayuhaman, aquela antiga fortaleza Inca, nas cercanias da cidade de Cusco, Peru, onde, no século XVI, houve a batalha final entre o povo Inca e os soldados do invasor espanhol Pizarro, o que alterou toda a História do nosso continente. É bem ali o coração da América; é ali que gente pode auscultar o solo e senti-lo bater, angustiado e arfante, na mágoa pela destruição dos seus amplos tempos de glória e pelas injustiças do presente. Nunca esquecerei a emoção de descobrir tal coisa, de entender que o nosso continente tem uma alma como as mães têm, já que Abya-Ayalla ele é, mesmo.

Passou-se bastante tempo; foi só no outro outubro, faz agora 15 meses, que eu voltei ao coração deste meu continente muito amado. Eu tinha muita coisa a contar-lhe, mas uma era a mais linda de todas.

Despistei todos os turistas de todos os lados do mundo que por lá andavam, e sorrateiramente me esgueirei até os píncaros daquela fortaleza que parece chorar, tamanho o peso das suas lembranças, e lá, no seu ponto mais alto, sentindo um enorme e poderoso coração pulsar sob mim, eu gritei – gritei bem alto, o mais alto que podia, gritei para o continente inteiro ouvir – o quanto eu amo o meu amor!

Abya-Ayalla entendeu, soube na hora. Seu poderoso coração sofrido de repente deixou de arfar, e disparou de alegria como disparam os corações das mães!

Obrigada pela solidariedade, Mãe Terra! O grande amor não tem como deixar indiferentes sequer o coração dos continentes!

Blumenau, 19 de Março de 2006.

*Urda Alice Klueger é escritora, historiadora e doutoranda em Geografia pela UFPR.

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